sábado, 22 de outubro de 2016

Reflexão sobre a guerra na Síria

O Oriente Médio é palco de conflitos entre povos desde a Antiguidade, possuindo relatos em diversos textos de diferentes nações, inclusive na própria bíblia. Os séculos passaram, mas o local permanece em constante atrito. Dentre os conflitos ali presentes gostaria de chamar a atenção para a guerra na Síria, pois não trata-se apenas de um confronto entre dois lados antagônicos que disputam o poder. Existe muito mais em jogo.

Até então as guerras caracterizavam-se, de um modo geral, por somatórias de forças em disputa no campo de batalha, como se fossem dois grandes vetores opostos em rota de colisão a fim de medir sua influência bélica para atingir determinado objetivo. Desse modo, os envolvidos no confronto formavam alianças até restar apenas dois lados dos quais resultaria em um lado vencedor e em outro derrotado. Daí tira-se a alusão da eterna luta entre o bem e o mal, na qual o perdedor se submete à superioridade do seu inimigo. A geopolítica é um grande jogo de interesses em que cada nação move as suas peças como em um jogo de xadrez com o intuito de atender às suas próprias vontades, separando os demais em dois grupos: amigos/aliados e adversários/inimigos. Essa distinção pode ser feita em diferentes cenários, seja político, militar ou mesmo econômico. Afinal, é natural que o ser humano aja de acordo com os seus desejos.

Entretanto, o que se nota na guerra da Síria é a disputa de três interesses distintos, formando um triângulo bélico cujas extremidades se confrontam mutuamente: em um dos lados do triângulos temos o exército do governo sírio Bashar al-Assad, apoiado pelo exército russo de Vladimir Putin; no outro lado do triângulo temos os rebeldes sírios inspirados pela Primavera Árabe e apoiados por grande parte dos países ocidentais europeus e, sobretudo, pelos norte-americanos de Barack Obama; por fim temos os terroristas que se auto intitulam de Estado Islâmico, que pretendem criar um califado na região, movidos por seu fanatismo religioso. Além disso temos a Turquia que hora tende aos russos, hora tende aos norte-americanos, hora combate os terroristas e hora combate as etnias minoritárias divergentes nas fronteiras do país, contando com um presidente que vem agindo de modo totalitário desde a tentativa de golpe em julho deste ano.

Além dos três lados do triângulo, existem os meios internos e externos. No meio interno de todo esse conflito triangular está a população síria que a cada dia que passa aumenta as estatísticas de refugiados, mortos e feridos. São inocentes civis cansados da guerra que já dura mais de cinco anos e que vem destruindo cidades, famílias, vidas e a esperança daqueles que sobrevivem ao massacre diário de metralhadoras e bombas. No meio externo está o restante do mundo que assiste a tudo de modo parcial ou imparcial. São pessoas, nações e organizações que não estão envolvidos diretamente no conflito (mas que podem tomar parte de um dos lados de forma inerte).

Desse modo, a guerra na Síria inova em termos globais com um jeito diferente de fazer guerra e esse não é um motivo de orgulho. Não posso afirmar que seja a primeira vez que um conflito nesses moldes se desenhe, mas não me recordo de algo parecido em nível internacional e com a magnitude em que acontece, reaquecendo a chamada Guerra Fria que, para muitos, havia sido extinta com o fim da União Soviética em 1991.

A única certeza que tenho é que dessa guerra de múltiplos lados e diferentes faces, ninguém sairá como vencedor, mesmo que assim se proclame. Afinal, nos livros de história aparecem muitas vitórias bélicas de países, mas na verdade o que fica para as pessoas (independente do lado) é recolher os cacos para tentar a reconstrução, não importando qual bandeira seja hasteada por último.



sábado, 8 de outubro de 2016

Reflexão sobre os não votos e a falta de liderança

O resultado das últimas eleições municipais deixou claro a insatisfação do povo brasileiro com a classe política. A falta de uma identificação representativa ficou evidente nos números dos não votos, que nada mais é do que a somatória dos votos brancos, nulos e abstenção. Ao analisar os indicadores dos municípios, é possível notar que há uma tendência no aumento dos não votos de um modo geral desde as eleições do ano 2000, tendo o seu auge agora nas eleições de 2016.

Em Sorocaba, segundo dados do TSE, foram 22.547 votos em branco e 50.574 votos nulos para prefeito. Se pegarmos o número total de abstenção, a informação torna-se ainda mais surpreendente: 89.156 dos eleitores de Sorocaba não foram votar. Somando os três dados obtemos 162.277 de não votos, o que representa 35,40% dos 458.334 eleitores do município – porcentagem considerável capaz de desequilibrar o resultado final dessa eleição. A problemática não reside nos não votos, que, ao meu ver, são legítimos e significativos, devendo ser respeitados. A causa raiz do problema está na falta de liderança e de propostas públicas que vão de encontra às necessidade do eleitor. Muito se fala e pouco se faz e essa e uma característica nacional. A credibilidade da política está arranhada em toda parte do planeta, haja em vista as eleições norte-americanas para a presidência, onde os candidatos possuem a maior taxa de rejeição dos últimos tempos no país.

Defendo que os não votos tenham peso na eleição, tornando-os votos que querem dizer algo além do contexto que lhe é apresentado e obrigado a participar. Como falar de política em um país cujo voto é obrigatório, porém a disciplina de ciência política não consta como obrigatória na grade curricular das escolas? Se o eleitor é obrigado a votar, então os votos brancos e nulos devem ser computados sim, pois o cidadão sai do seu lar no domingo para dar a sua voz, seja ela qual for. É assim a democracia, devem ser ouvidos mesmos os que não concordam com o sistema vigente (o que não representa uma pequena parcela da população, como demonstrados nos dois primeiros parágrafos deste texto).

Nos sistemas antigos de sociedade, a figura do chefe era traçada com características de carrasco. Essa imagem permaneceu até meados do século XX, quando teóricos do ramo administrativo, tais como Taylor e Ford, começaram a elaborar uma matriz cada vez mais robusta e definida para os líderes, fatiando o conhecimento através da divisão internacional do trabalho, com o intuito de aumentar a produtividade como meio para o fim maior, que era e ainda é o lucro do proprietário. A gestão de pessoas passou a ser ciência com métodos e princípios próprios. Porém, não é difícil ouvir relatos de funcionários que denunciam abuso de poder e assédio moral (algumas vezes até sexual) de seus superiores. Hoje o papel do líder superou as perspectivas antigas de relacionamento entre lados opostos, instaurando-se como um intermediador no conflito de classes. E é nessa carência de liderança (tanto no âmbito público quanto no privado) a que me refiro quanto ao desinteresse por parte da massa, seja como cidadão, seja como profissional.

É surpreendente que em pleno século XXI ainda vejamos nos telejornais casos de trabalho em regime de escravidão, em que a figura do líder simplesmente não existe, deixando todo o espaço a ser preenchido por donos que na verdade são senhores que impõem as suas regras. Desse modo, o ser humano deixa de ser visto como tal e passa a ser um mero objeto, uma “coisa” para que se atinja determinado fim de acordo com o interesse alheio.

No ambiente de trabalho, o entrave está na mão de obra assalariada do indivíduo que precisa vender a sua força de trabalho para sobreviver e do avanço tecnológico e, consequentemente, das máquinas, que torna o processo seriado como central, deixando o ser humano às margens, como uma contradição de lados opostos nas extremidades. A liderança surge justamente para remediar conflitos, sendo o elo de ligação entre os dois opostos para que se atinja a meta estabelecida. Tendo essa visão, o líder é a balança que equilibra a dinâmica (formal e informal), servindo de suporte para os colaboradores em busca de atingir o alvo estabelecido pelos donos e/ou acionistas. Portanto, não é exagero visualizar o líder como uma ponte em determinado grupo.

Sendo assim, é necessário diferenciar conceitos que atualmente são utilizados como sinônimos, mas que possuem perfis distintos (mesmo que a origem de ambos seja compartilhada): o chefe e o líder. Chefe é a pessoa que foca nos resultados, independente dos meios necessários para que se atinja determinado fim, este último servindo como justificativa para abusos. Já o líder é o indivíduo que foca nas pessoas, entendendo que se as mesmas estiverem estimuladas e com as ferramentas adequadas é possível atingir os objetivos estabelecidos de forma natural e sem traumas, atendendo a demanda tanto de quem executa a tarefa quanto de quem as cobra. É aquele cidadão que os demais respeitam e se espelham cuja função é fazer com que as pessoas realizem suas tarefas da melhor forma possível.

Através dessa diferenciação é possível notar que a linha entre um chefe e um líder é tênue; afinal, ambos são gestores. A atuação de tal persona é analisada diariamente por superiores e subordinados, esperando do mesmo que sua conduta ética seja adequada para desempenhar a função. Com isso, temos uma vigilância intensa sobre os líderes de ambos os lados, o que em certas vezes resulta no desgaste físico e psicológico deste.

No ambiente público é preciso citar a captura do Estado por grupos de interesse, que atingem o objetivo não por mérito, mas pelo domínio histórico e que pretendem perpetuar sua influência de modo a não ceder espaço para o novo. Desse modo, temos o impasse entre interesses políticos contra a capacidade técnica-administrativa. É preciso tomar cuidado quanto ao carisma e popularidade de certos indivíduos, que podem possuir o dom da oratória utilizado para o interesse próprio, tornando-se oportunistas que se aproveitam da descrença social na classe política. O planejamento a longo prazo, independentemente da cor da sua bandeira, é fundamental para o surgimento de lideranças capazes de alterar o status quo e administrar políticas públicas sérias e coerentes, com responsabilidade fiscal.

A liderança está presente em todos os níveis sociais, desde o presidente de determinada nação, passando pelo capitão do corpo de bombeiros até o monitor do chão de fábrica. Por esse motivo, o desenvolvimento de líderes em uma sociedade é de suma importância. Os líderes são seres históricos de modo que nem o tempo pode apagar sua memória. São lembrados pelos seus atos, sejam bons ou ruins.

Não basta para alguém que almeja a liderança dominar apenas as ferramentas administrativo-burocráticas do sistema. É preciso saber ouvir as pessoas, ter a empatia de se colocar na situação alheia, compreender as causas e motivos (mesmo que não concorde), descobrir dificuldades para que se crie soluções. É preciso ter bom-senso e responsabilidade para que se possa ser um tomador de decisões e agir de forma assertiva.