sexta-feira, 26 de abril de 2019

Reflexão sobre o diário de um desempregado

Acorda cedo, sem hora para terminar
Prepara o café, arruma a casa
Chama as crianças para a escola
Prepara o fôlego para mais um dia
Insistência, persistência, resistência
Pasta no braço, currículo na mão
Carteira de trabalho sem registro
São as contas que não param de chegar
As bocas para alimentar
Pego ônibus lotado
Sem lugar para sentar
Vai de empresa em empresa
Fila em cada rh
Sonha
Não pensa para não desanimar
Apenas sonha e segue
Vai meio sem rumo
Até quando a perna aguentar
Na tv o ministro diz que vai melhorar
O jornal fala de melhora na economia
Mas já faz um ano que segue na rotina do desemprego
Demissões
Diário de um desempregado
Acorda cedo para enviar currículo
Liga o computador e fica até a noite chegar
Busca marcada pela esperança pela contratação
Limpa a casa, liga o rádio para tentar relaxar
Força, foco, fé
Mas a angústia continua
Melancolia, tristeza, depressão
Não se pode deixar abater
O presidente diz que vai melhorar
Mas o índice de desemprego não para de aumentar
Sobra cobrança, falta oportunidade
Então sonha sem pensar e segue
Refém dos bancos, refém do mercado
Um sistema de exclusão e gentrificação
Que afasta do centro para as margens
Falta espaço, falta tempo, falta dinheiro
É o chocolate que não vai poder dar
O presente para o filho que não consegue comprar
Clivagem social, seja por gênero ou idade
Mesmo assim segue
Sabe que não pode parar
Mãos calejadas
Dor no joelho
Falta dinheiro até para a passagem
Várias reformas aprovadas
Mas a vida continua a mesma há meia década
Talvez até pior
Tanto se fala em previdência
Mas falta o básico
Falta ensino, segurança e saúde de qualidade
Falta emprego
Falta o sentimento de reconhecimento e dignidade
Olha para o lado e respira um pouco
Foram tantos currículos que até perdeu a conta
É o atraso que sufoca
A falta de perspectiva que afoga
Vida dura, suada e seca
Contradições e perguntas sem respostas
Informalidade quase indigente
E ainda querem mais
Bem diferente dos engravatados em seus discursos
A realidade se impõe
Por vezes machuca
Ferida social aberta não cicatrizada
O preço é muito alto
Mas parar não está entre as opções
E assim segue com sua sombra
Com medo e esperança
Sabe que amanhã será um novo dia
As luzes se apagam
O silêncio externo contrasta com a agitação interna
E o ciclo se repete de novo e de novo.

sábado, 13 de abril de 2019

Reflexão sobre o Brexit

As relações internacionais, que tendiam à abertura mundial por meio da globalização após o período de bipolarização presente na Guerra Fria, agora encontram obstáculos até mesmo de nações tidas como liberais e que agora apresentam um individualismo imediatista. Como exemplo é possível citar as duas principais nações anglo-saxãs: os Estados Unidos de Trump e a Inglaterra de Theresa May. Esta última com o diferencial de busca pelo reconhecimento na contemporaneidade pela hegemonia de outrora. 

O processo de separação do Reino Unido com a União Europeia ficou conhecido como Brexit que em inglês significa saída (exit) dos britânicos (br) do bloco ao qual pertencem desde 1973. É bem verdade que a geografia de ilha da Grã-Bretanha afastada do continente pelo Canal da Mancha e a utilização da libra como moeda oficial mesmo após a adesão do Euro como moeda do bloco europeu conferem algumas peculiaridades. A onda protecionista e nacionalista influenciada, sobretudo, por questões econômicas e pelos fluxos migratórios tornam-se um solo fértil para análise da conjuntura atual. Assim é Babel, conforme descrito por Zygmunt Bauman: entre a incerteza e a esperança. O tradicional conservadorismo insular se faz presente no século XXI.

brexit o que é causas consequências para brasil e mundo

Em 2016 o então primeiro-ministro do Reino Unido David Cameron fracassou politicamente ao colocar em votação um referendo sobre a saída do país do bloco europeu. Após a vitória daqueles que eram favoráveis ao divórcio por uma pequena margem de diferença (51,9% a favor da saída contra 48,1% favoráveis à permanência) o mesmo se viu obrigado a deixar o cargo e renunciou depois do congresso de outubro do seu partido.

Cameron foi sucedido por Theresa May que prometeu atender aos anseios britânicos por meio de um processo de separação que não traria grandes consequências aos envolvidos e levaria a cabo a histórica decisão dos mais de 30 milhões de eleitores (71,8% do total) que compareceram às urnas para expressar o seu desejo, fato que não foi comprovado com o passar dos anos.

Brexit and access to UK financial markets by EU27 firms

Desde então o que se vê são sucessivas discussões no parlamento britânico sem a costura de um acordo político viável. O dilema até o momento se baseia em duas opções: (1) um acordo com o parlamento europeu de mútuo entendimento entre as partes; (2) saída abrupta e sem acordo com a União Europeia, o que acarretará em várias perdas e um grande impacto na economia da ilha.

A busca pela retomada dos holofotes por parte dos britânicos assim como fora nos séculos pertencentes à modernidade mostra-se como uma típica nostalgia da hegemonia passada. Em especial, a predominância inglesa no século XVIII por meio da Primeira Revolução Industrial e consolidação após a vitória nas Guerras Napoleônicas durante o século XIX, interferindo em assuntos como independência, escravidão, monarquia e dívida pública do Brasil no período.

brexit o que é

A peculiar monarquia democrática parlamentarista britânica se encontra perdida entre realizar uma nova consulta pública, validar o resultado do referendo e atuar para a separação ou ignorar o voto dos cidadãos em prol da continuidade do relacionamento ao não romper com a integração europeia. De qualquer modo, as consequências da eventual ruptura já são sentidas no Reino Unido com a saída de algumas empresas para o continente europeu sendo que parte da própria população local pede um novo referendo alegando que foram iludidos por promessas não cumpridas dos defensores do Brexit.

O estrago já é sentido e aumenta conforme o prazo chega sem uma solução viável no horizonte que agrade as duas partes envolvidas. O caminho do meio tal como citado por Aristóteles no livro “Ética a Nicômaco” ainda não foi encontrado pelo sistema parlamentarista insular diante da suposta democracia monárquica. Mais uma vez as contradições do capitalismo se acentuam por meio de um suposto neoliberalismo globalizado.