Mais um ano chega ao fim e com ele as incertezas tipicamente humanas. Diante de tantos acontecimentos em um curto período de tempo fica difícil compilar todos os eventos em um texto, mas uma retrospectiva não é a intenção deste post. Como tudo o que acaba deixa marcas, creio que o mais importante aqui é refletirmos sobre o ser humano e suas condições. É inegável que nessa época do ano as pessoas fazem um esforço para serem melhores do que foram ao longo do ano inteiro, então tentarei ser sereno sem doses excessivas de ilusão otimista.
Creio que muitos concordam de que não foi um bom ano nos aspectos políticos e econômicos. Em Brasília o mesmo teatro de sempre, mas agora o novo jogo é a dança das cadeiras graças a operações do judiciário, como a tão famosa Lava Jato (talvez eleita a musa do ano). O imponderável tomou conta do cenário político, mas os fins continuam justificando os meios. Em outras palavras, o fim é a posse do poder e os meios é o atropelo social para com a população brasileira. Ao longo deste mês assisti a várias entrevistas de representantes dos três maiores partidos políticos do país (PMDB, PSDB e PT) e em todas a temática principal são os interesses e alianças para a tomada do poder, independente do que tenha que ser feito (e muitas vezes tais atitudes vão contra princípios legais e morais).
Não precisa ser um expert em política para saber qual a situação do país e do mundo, basta assistir a Game of Thrones e lá teremos um ótimo resumo: são vários grupos que representam diversos interesses cujo objetivo é tomar o trono e reinar. Assim é com o capitalismo, como foi com o império romano, com o nazismo, com o fascismo, com o comunismo e com outro qualquer regime que chegou ao trono. Há um abismo entre o campo ideológico e a prática conforme a doutrina eleita a ser seguida. Desse modo, a tão sonhada liberdade, igualdade e fraternidade são deixados de lado. Até mesmo a Revolução Francesa teve as suas marcas negativas, dando origem à burguesia que no regime atual dita o certo e o errado para seres humanos que são tratados como gados, vistos apenas como um número entre tantos. Tudo tem dois lados e a tecnologia também, transformando a política em um meio de domesticar o povo por meio da massificação, despejando conteúdos (algumas vezes mentirosos) sem que seja realizada a devida análise e debate. Somos o gado no pasto sem saber quando será o abate.
E assim sobrevivemos: matando o tempo na internet e na tv antes que o tempo nos mate. E assim se vai mais um ano, com a sensação de que ficou muito a se fazer. Ainda há muito o que lavar para limpar o solo desta pátria. Enquanto isso o trabalhador perde direitos e garantias iludido pelo conceito de economia. O que é a economia se não um sistema criado pelo homem que vai além da troca de mercadorias necessárias para uma qualidade de vida? Vai além, muito além do que se precisa e isso faz com que poucos detenham muito e que o restante (que representa quase todo mundo) fique sem nada. E assim somos obrigados a nos submeter ao trabalho que não dignifica um ser racional, com um salário de subsistência. O que é o dinheiro se não um pedaço de papel que inverteu os valores sociais, onde o ter significa muito mais do que ser?
Mesmo para um sonhador como eu fica difícil ser otimista e a cada ano que passa tenho a impressão de que o brilho da esperança fica um tanto quanto ofuscado na minha visão. As guerras nunca acabam. A Síria é só um exemplo de tantos outros conflitos que existem em toda parte do mudo. Veja os países ditos desenvolvidos com a incerteza do próximo atentado terrorista. Veja os conflitos na África. Na violência não existe distinção entre ricos ou pobres. Em uma sociedade moldada para a vitória, somos todos perdedores. E o medo de sair de casa de noite aqui no Brasil, onde facções criminosas estão cada vez mais organizadas, infiltrando-se na polícia e na própria política. A violência é a guerra constante de todos contra todos e nesse ponto Thomas Hobbes estava errado ao dizer que o homem era violento no estado natural e que a solução viria com a formação e manutenção do Estado e da propriedade privada. Pois bem, territórios (ou propriedade privada se preferir) ainda são alvos de disputas, guerras e mortes. E há quanto tempo que isso acontece? Certas vezes o que há é o inverso: a naturalização da violência.
As pessoas se dizem mais propensas à fraternidade nessa época do ano, mas por que só agora? É hipocrisia querer ser alguém que não é. Passam o ano inteiro brigando para ter algumas semanas de paz. E o pior, essa paz vem banhada de álcool, consumo e imprudência. Será que a humanidade se vendeu? Apenas mais um objeto nas mãos de pessoas mais preocupada em pagar a dívida para os banqueiros do que em cuidar da sociedade que os elegeu. E refletindo temo que 2016 se prolongue, como uma prorrogação interminável de futebol, pelos próximos dez anos ou mais, muito graças a uma equipe econômica que trata a população com comprimidos de placebo. O erro não está apenas nas PECs, mas na aceitação do sistema como um todo. Enquanto houver capitalismo haverá FMI (Fundo Monetário Internacional) e haverá dívida externa por uma colonização de exploração. Haverá banqueiros e empresários faturando com a desgraça dos outros, sedentos por mais e mais, até criarem uma nova guerra. Quanto custa uma vida? Pelo visto, a cada ano que passa a alma perde seu valor,
Sabe qual a melhor parte do final do ano? É ter a esperança que ano que vem as coisas vão melhorar e que tudo pode mudar, mesmo depois de tudo o que aconteceu. É olhar para a cidade da janela de casa e sentir o vento da noite e o silêncio. Ver o céu e as estrelas e sentir a tranquilidade da vitória por vencer mais um ano. Sim, somos lutadores e vencedores por suportar mais um ano de pancadas. E com as mudanças desse ano eu tenho a impressão de que no fundo nada mudou: tudo faz parte de um ciclo de corrupção e injustiça que vem e vai. E assim é o universo: horas conspira a nosso favor, horas conspira contra, sem ao menos nos dar o mínimo de respostas e explicações. O bom de dezembro é reencontrar amigos e rever parentes, mesmo com a dor daqueles que não estão mais entre nós. E final de ano é sempre assim, é hora de voltar a sonhar e pedir para que as coisas melhorem. Desejos de saúde e paz, será que é pedir demais? É tempo de nos tornamos humanos e talvez voltarmos à consciência, mesmo que por poucos dias.
Sendo assim, gostaria de agradecer a todos os amigos e parentes que estiveram comigo ao longo de 2016. Agradeço também a todos os que visitam o blog e que refletem comigo. E que se faça a justiça e o amor, que se faça a revolução da consciência do ser humano e do seu estado de aprisionamento. E que encontremos no final do arco-íris o nosso pote de felicidade. Espero que nossas vidas melhorem e com ela o meio em que vivemos. Que o trenó da esperança nos visite mais vezes. Feliz natal e ano novo!