sábado, 28 de julho de 2018

Reflexão sobre notícias falsas (fake news)

Não adianta relutar, pois está em todos os lugares. Fake news: notícias falsas que se propagam cada vez mais por meio da utilização de diferentes tipos de mídias sociais. Em questão de segundos a sementinha da discórdia pode infectar milhares de aparelhos eletrônicos (celulares, computadores, televisores, etc.) e mentes. Entretanto, se são falsas então não são notícias. Trata-se de um processo de desinformação que apresenta o padrão de tomar o papel de protagonista em períodos eleitorais. Tal questão se agrava em ambientes de polarização política e crises, sejam econômicas ou migratórias.

A internet é o principal caminho pelo qual percorrem as chamadas fake news. Com a ampliação do acesso à tecnologia e também devido aos avanços promovidos pela quarta revolução industrial que se inicia, uma simples matéria especulativa ou reportagem tendenciosa pode repercutir no país inteiro. O movimento é simples: as pessoas que compartilham da mesma visão de mundo abordada em tal "notícia" iniciam o processo de promoção e divulgação da mesma, geralmente sem qualquer critério mínimo de análise quanto a veracidade. Basta um click e pronto: está feita a disseminação de uma mentira. 

Fonte: https://leonardoconcon.com.br/cidade/geral/opiniao/nao-as-noticias-falsas/

As etapas seguintes são mais complexas e perigosas, pois apesar do compartilhamento ser rápido e fácil, tal ato é capaz de gerar um movimento em cadeia fazendo com que inverdades se transformem em  falsas verdades, ultrapassando assim o limite virtual para a realidade. Essa infestação pode ser danosa, assim como a contaminação de uma praga na plantação. Por vezes os debates se transformam em disputa por poder, brigas ideológicas sem qualquer base intelectual podendo chegar às vias de fato. Passa a ser a luta entre o "nós contra eles", aonde os envolvidos buscam a verdade absoluta sendo que nem a vida ou as ciências (conhecimentos comprovados com base em metodologias teóricas e empíricas) são capazes de trazer respostas definitivas e verdades supremas eternas.

Além da eventual anomia que a propagação de fake news pode causar, há também o risco de culpar inocentes, de julgar antes do julgamento jurídico, sem provas, sem direito à ampla defesa. Risco de caluniar grupos de forma incorreta e indevida, pode prejudicar famílias inteiras, acabar com a carreira de profissionais, difamar o próximo denegrindo sua imagem sem dó nem piedade, pode enganar uma população inteira por meio de mitos, mesmo não se tratando de fatos. A comodidade da internet torna-se um risco em si quando não se sabe utilizá-la. Mesmo em grandes corporações jornalísticas não há imparcialidade; portanto, necessita-se de discernimento e bom-senso ao ler determinada reportagem, pois nem sempre o que convém é o que realmente acontece.

boataria
Fonte: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2017/02/mentiras-e-boatos-especialistas-apontam-os-riscos-do-compartilhamento-de-noticias-falsas

A dimensão e o peso de tal neologismo inglês rompe fronteiras transformando-se em um problema global. É o uso com fins desviantes da tecnologia refletindo a dualidade inerente da psique humana (a luta entre o bem e o mal). Mais do que isso, o processo de desinformação é crime, visa atingir as massas, criar agitação, separar ao invés de unir. O debate é válido e bem-vindo; porém, a busca incessante para se ter razão independente dos fatos é pura ignorância. A nomenclatura em si está incorreta, pois não se trata de notícias, mas de desejos absolutistas em se estar certo e comprovar isso por meio de compartilhamento, mesmo que não sejam fatos.

Há um fetiche oculto a ser satisfeito, independente de meios ou fins. Se não for para a afirmação própria de um pensamento ou posicionamento sobre determinado tema, então é para a obtenção de lucro, pois existem aqueles que divulgam e compartilham fake news cientes das inverdades em seu conteúdo, mas o fazem para conseguirem várias visualizações, curtidas e compartilhamentos para assim aumentarem o próprio faturamento, independente de questões morais. A participação está no emissor e também no receptor que se deixa levar sem investigar.

identificar fake news
Fonte: https://www.significados.com.br/fake-news/

Os produtores elaboram as mentiras conscientemente apelando para o emocional e para a ingenuidade dos membros de determinado grupo que se identificam com a matéria. A intensificação do fenômeno é consequência da própria demagogia política que passa ao público dados incorretos propositalmente ou mesmo abusam de mentiras em campanhas na tentativa de cooptar o maior número de cidadãos desinformados. Quem não se lembra da baixaria que foi a última eleição presidencial para o cargo de presidente, protagonizado sobretudo no segundo turno pelos então candidatos Aécio Neves e Dilma Rousseff? Quatro anos se passaram e cá estamos novamente.

Não se iluda caro leitor, a ceninha dos candidatos na corrida eleitoral já começou. A questão é quem vai mentir menos e formular uma agenda de governo coerente e factível. Enquanto isso, cabe às pessoas serem críticas no repasse de informações, duvidar, pois o ceticismo é fundamental na busca por fatos. É preciso levar em consideração a legitimidade da fonte, a credibilidade do autor, a coerência do conteúdo e se tal notícia possui algum tipo de comprovação. É como diz o ditado popular: quem conta um conto aumenta o ponto. Precisa-se verificar até qual ponto é verídico ou se é fruto da criação de mal-intencionados na manipulação da informação. 

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Reflexão sobre o nepotismo

Do avô para o pai, do pai para o filho, do filho para o neto. Certos vícios são cíclicos, correntes nem sempre são fáceis de quebrar. Desde os tempos de Cabral até o Congresso Nacional, a história política do Brasil é composta por ilustres famílias, sobrenomes de peso que favorecem a própria linhagem na manutenção do poder. O sucessor, o filho, príncipe, primeiro, legítimo herdeiro. Dom João VI, Dom Pedro I, Dom Pedro II, Princesa Isabel. Muitos dons, pouca renovação.

Nepotismo é o favorecimento de parentes nas relações trabalhistas. Às vezes é aquela indicação discreta e legal no interior de uma indústria privada. Por vezes é por meio da tentativa de imposição de um cargo público (como Roberto Jefferson tentou fazer com sua filha Cristiane Brasil para representar o PTB na composição do governo para o Ministério do Trabalho). Trabalho livre e democrático preso por amarras familiares destronando a chamada meritocracia. Tal fato não se restringe à política, basta verificar as famílias tradicionais do seu município: aquele grupinho que comanda o comércio nos principais pontos da cidade, o escritório de advocacia do século passado, os principais proprietários de terra que controlam a especulação imobiliária. Não precisa de muito esforço, é só olhar ao redor.

nepotismo
Fonte: http://www.excelenciaeducacao.com.br/2018/01/

Além do corporativismo existente dentro do seio familiar, tal questão torna-se problemática na esfera da administração pública e seus respectivos cargos. Segundo a CGU (Controladoria Geral da União) em seu site, o nepotismo ocorre quando um agente público usa de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer um ou mais parentes sendo vedado pela Constituição Federal, pois fere os princípios da impessoalidade, moralidade e igualdade. Portanto, estamos falando de um crime e não de um mero acaso preenchido pelo destino no berço.

É natural que as pessoas tenham afinidades por seus semelhantes e que isso faça com que haja um verdadeiro círculo restrito de favorecimento para crescimento mútuo, seja envolto por laços parentescos ou mesmo por identificação como amizade ou profissional. As pessoas se agrupam de acordo com os respectivos interesses como uma forma de sobrevivência, tendendo a se fechar como, por exemplo, a maçonaria.

A questão é quando os laços familiares adentram a esfera pública, contrariando a lógica posta pelo Estado democrático de direito. É como dizem os especialistas em negócios: network é tudo! Desse modo, competência, igualdade de oportunidade, qualificação, experiência e até conceitos éticos são deixados de lado, mesmo que não contrariem necessariamente a legalidade. Ao final tem-se a mesma fórmula: concentração de muito nas mãos de poucos. Uma verdadeira elite familiar.

Fonte: https://leiparapobre.blogspot.com/2017/01/prefeito-que-nomeia-irmao-em-cargo-de.html

Como exemplo de monopólio político é possível citar alguns nomes que fizeram ou que ainda fazem parte do mainstream de players políticos do Brasil: (a) Tancredo Neves (avô) e Aécio Neves (neto); (b) José Sarney (pai) e Roseana Sarney (filha); (c) Renan Calheiros (pai) e Renan Filho (filho); (d) Jorge Picciani (pai) e Leonardo Picciani (filho); (e) Jair Bolsonaro (pai) e Eduardo Bolsonaro (filho); (f) Antônio Carlos Magalhães (avô) e ACM Neto (neto); (g) Cesar Maia (pai) e Rodrigo Maia (filho).

No nepotismo político, as brechas se fazem por cargos de confiança, indicações, troca de favores, cooptação da máquina pública para a realização de interesses escusos e totalmente privados (sempre visando levar a melhor). Compromete não só o sistema presente, mas também o seu futuro, impedindo uma renovação factível com a entrada de novos atores que realmente representem os anseios da população. Assim o ciclo se fecha em si mesmo, da tia para a sobrinha, do pai para o filho, um fim em si mesmo para benefício exclusivo dos parentes envolvidos. 

segunda-feira, 9 de julho de 2018

Reflexão sobre pesquisas quantitativas e qualitativas

No período eleitoral é comum a coleta de dados sobre a opinião de eleitores com relação a candidatos, partidos e temas presentes na agenda pública para o debate e elaboração de propostas de políticas que atendam o anseio dos cidadãos. Junto às pesquisas que se multiplicam em tal período há também um certo descrédito que vem aumentando com relação ao desenho estatístico e aos resultados finais que por vezes são diferentes do projetado. É necessário abordar conceitos e metodologias científicas introdutórias para elucidar o mistério da temática.

Dois grandes exemplos internacionais sobre a divergência entre pesquisas e resultados foram o Brexit e a última eleição presidencial estadunidense que culminou na vitória de Donald Trump sobre Hillary Clinton. Em ambos os casos as pesquisas que antecederam as votações erraram, resultando no oposto do que foi apontado. No Brasil, a surpresa recente ficou a cargo da vitória de Dória em primeiro turno para a prefeitura de São Paulo quando as pesquisas apontavam segundo turno. Especialmente na política nota-se que há um uso excessivo de métodos quantitativos isolados que, mesmo pautando-se em critérios para a consolidação do trabalho, carecem da complementação de dados qualitativos.

Fonte: http://marketingcomcafe.com.br/as-pesquisas-eleitorais-resistirao-frente-nova-realidade-digital/

A atividade científica é coletiva e estuda medidas. Entretanto, fatores interpretativos e tendências cognitivas devem ser levados em consideração no estudo social. Afinal, dados são aproximações da realidade, não verdades absolutas. Assim sendo, um estudo sobre intenção de voto e percepção do indivíduo vai além de simplesmente números. A complexidade do caso é infinita de modo que a utilização complementar dos métodos é a melhor forma de mitigar as discrepâncias, pois permitem produções de estimativas coerentes, um recorte representativo da sociedade por meio de uma amostra válida. Portanto, trata-se de fenômenos aleatórios e desorganizados, prováveis, mas incertos.

O conhecimento é cumulativo e consolida paradigmas por meio de resultados que apontam convergência sobre determinado tema. Nesse sentido, a pesquisa deve ser elaborada com tempo e seguindo critérios metodológicos padronizados, buscando realmente ouvir as pessoas e entender o que foi dito, interpretando, além das palavras, os valores ali presentes (explícitos e implícitos). O tempo é fundamental na produção de uma pesquisa, tanto de quem é entrevistado quanto de quem entrevista e analisa os dados. Os elementos para a análise são: hipóteses, conceitos, variáveis, indicadores, resultados e referências.

A pesquisa quantitativa pauta-se pela obtenção de informações que serão apresentadas como dados estatísticos, uma população que compartilha uma característica. Entretanto, tal procedimento tem sido realizado de forma superficial. Uma das hipóteses para isso é a competitividade e velocidade nas quais a sociedade está inserida. Cada vez espera-se informações mais rápidas e assertivas pelo público, levando os meios de comunicação em uma disputa organizacional para trazer a matéria de capa atualizada em primeira mão. Todos querem ser atraentes para os leitores/telespectadores (consumidores) e com isso atropelam passos de pesquisas para levarem resultados que algumas vezes são tendenciosos e não retratam um recorte coerente da realidade. A escolha por métodos exclusivamente quantitativos é um exemplo.

Pesquisa Eleitoral 2018
Fonte: https://xn--eleies2018-r6a2o.com/pesquisa-eleitoral-2018/

A pesquisa qualitativa enfatiza a preocupação em estudar o assunto em profundidade. Tem como vantagem acessar o mapa cognitivo da população participante da pesquisa. Trabalha com interpretação e análise causal. Caracteriza-se pela subjetividade e desenvolvimento de teoria, partindo do todo para as partes. Baseia-se no raciocínio dialético e indutivo por meio da comunicação e observação. A pesquisa quantitativa mede a intenção de voto em determinado momento. Trabalha com descrições formais e superficiais aonde o valor considerado é a quantidade. Quanto maior a amostra, menor será a margem de erro. Portanto, caracteriza-se pela objetividade, foco conciso e limitado, indo das partes para o todo. Análise estatística, lógica e dedutiva, estabelecendo relações e causas.

Diante dos desafios e da complexidade que a engenharia social se depara é necessário cautela e um estudo abrangente dos fatores envolvidos na pesquisa. Desse modo, é possível concluir que a união entre métodos qualitativos e quantitativos é essencial para a apresentação de resultados que expressem determinado momento da sociedade, levando em consideração não só a intenção (palavra) do entrevistado, mas o contexto cognitivo, o grau de interferência externa e a formação interna do indivíduo, verificando antecedentes e tendências culturais na formação de um modo de vida e pensamento.