segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Reflexão sobre partidos políticos

Como o próprio nome já diz, partidos políticos representam partes da sociedade, grupos que se juntam conforme afinidades políticas. Longe de ser um consenso, a definição sobre o tema varia conforme os diferentes pensadores. Mesmo assim é necessário compreender do que se trata, tendo-se em vista que os partidos políticos estão entre as figuras centrais das instituições que compõem o Estado contemporâneo por meio da democracia participativa indireta desde a expansão do sufrágio universal em meados do século XIX. 

De forma compacta e genérica, partidos políticos são grupos organizados que buscam o controle do poder por meio das eleições, visando assumir o governo. São pessoas jurídicas de direito privado fundamentais para o funcionamento da democracia representativa que vigora em boa parte do planeta na atualidade. O sucesso eleitoral conforme descrição acima é um tanto quanto reducionista, pois pode excluir partidos antissistema e países de regime de partido único cujo intuito principal de tal legendas não é obter êxito nas eleições. Portanto, tal definição serve apenas de base para a construção do raciocínio sobre a temática.

Órgãos provisórios Partidos Políticos

É possível apontar duas diferentes características sobre a origem de um partido político: (a) interna - são os partidos formados pela união de grupos parlamentares; ou seja, formado por pessoas de dentro do jogo político que já integram o sistema; (b) externa - são os partidos formados por grupos de fora do parlamento como, por exemplo, movimentos sociais e sindicatos. Este último tipo possui uma maior centralização no que concerne a sua organização e também uma maior identificação entre seus membros, possuindo um contato interpessoal mais amplo.

Partindo de uma visão ampla, é possível afirmar que os partidos políticos fazem o meio de campo entre a sociedade civil e o Estado, sendo assim uma ferramenta institucional de ligação regularizada pelo próprio sistema - o que de certa forma inibe a formalização de agrupamentos políticos radicais contrários ao sistema. Afinal, a manutenção das regras pertence ao grupo dominante que está no poder e, desse modo, não é interessante fomentar grupos cujo objetivo central é a ruptura do status quo.

Partidos políticos: ¿De dónde proviene el dinero para sus campañas electorales? - dreamstime.

Utilizando-se dos critérios para diferenciação dos partidos políticos segundo o cientista político LaPalombara, referencial este colhido durante a graduação, é possível apontar quatro tópicos: (1) organização durável: continuidade da organização ao longo do tempo (historicidade da instituição partidária); (2) organização completa: existência de uma organização formal nacional e local, de modo que não sejam apenas agrupamentos parlamentares; (3) vontade de exercer o poder: seja sozinho, seja por meio de alianças ou coligações; (4) busca do apoio popular: filiação de membros e busca por eleitores.

Existem outras formas de classificar e categorizar as legendas como analisar a estrutura organizacional (desenho hierárquico), meios de obtenção para financiamento, posicionamento ideológico, modo de relacionamento com os próprios membros e com a sociedade, entre outros. Desse modo, é possível rotular os "catálogos de famílias partidárias" conforme os seus alinhamentos e visão de mundo como liberais, operários, religiosos, etc. Fica claro aqui que os partidos políticos são partes que representam as clivagens sociais existentes.

TRE-GO Filiação Partidária

Sobre os tipos canônicos, os principais são: (a) partido de quadro - segundo Maurice Duverger, possui poucos membros, mas contribuem diretamente, seja por meio de contribuições financeiras, seja por meio de atividades no partido; (b) partido de massa - ampla organização extraparlamentar atuante não somente no período eleitoral, mas de forma permanente no recrutamento de membros e nas demais atividades. Além disso, esse modelo argumenta que as legendas têm forte ideologia, representando segmentos sociais específicos; (c) partido catch-all - surge devido ao sucesso dos partidos de massa. Entre os principais fatores para o seu surgimento, Otto Kirchheimer aponta para a desideologização do discurso, fortalecimento da figura da liderança, declínio da militância de base e abertura de interesses variados; (d) partido cartel - modelo da relação e dependência entre partido e Estado por meio de subsídios públicos, constitucionalização, acesso a bens públicos, reconhecimento e formalização do partido, criação de leis específicas, entre outros.

É possível concluir que a dinâmica atual do sistema democrático representativo está ligada diretamente aos partidos políticos. Estes são a ligação entre os anseios populares da sociedade civil e a representação de seus eleitos dentro do aparato estatal. A manutenção do sistema político atual depende da organização e da atuação dos partidos, quer goste ou não. 

Mesmo que tal modelo seja utilizado por vezes para aspectos positivos para a construção social, por vezes para aspectos negativos visando interesses particulares, não há como realizar uma democracia indireta com sistema político e eleitoral sem a participação de partidos. Formas alternativas como a participação direta ou mesmo ausência de um poder estatal central são consideradas antissistema e classificadas hoje em dia como utópicas (apesar de possíveis) por pregarem a ruptura com o sistema vigente.

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Reflexão sobre a deflação demográfica e a geografia do capital

O crescimento populacional foi exponencial em todos os continentes, passando de 600 milhões em 1700 para 7 bilhões em 2012, estimulado sobretudo pela Ásia onde atualmente é possível apontar como exemplo o caso da China, país mais populoso do mundo com quase 1 bilhão e 400 milhões de habitantes, seguida de perto pela Índia que também já superou a marca de 1 bilhão de pessoas conforme apontado por Thomas Piketty no livro O Capital do Século XXI (p.80, 2014).

Entretanto, tal fenômeno de superpopulação não se configura uma tendência mundial para os cenários dos próximos séculos. Estudar a dinâmica demográfica é fundamental para analisar a evolução da população e estimar o seu futuro com base em indicadores e taxas. Malthus (economista inglês) teorizou em 1798 que a capacidade produtiva de alimentos cresceria em progressão aritmética enquanto que a população cresceria em progressão geométrica, iniciando uma abordagem ampla para discussão sobre elementos geográficos e econômicos.


O Brasil recentemente ultrapassou a marca de 210 milhões de habitantes. Segundo projeções da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre a população brasileira, estima-se que entre 2030 e 2035 o país atingirá o seu ápice populacional com 218 milhões de habitantes e depois passará por um processo de queda demográfica que pode representar cerca de 113 bilhões já em 2100. Tal declínio se assemelha com o que é previsto para outros países neste novo milênio. A deflação demográfica já é uma realidade em estágio inicial no Japão e em alguns países da Europa Ocidental.

O sistema capitalista necessita de crescimento, seus genes contêm cromossomos de superávit diários. Lutar contra isso seria contrariar a sua própria composição. O aumento da produtividade e do consumo costumam ser as respostas do capital para sair das crises que o assola. O não crescimento significa recessão, incertezas, prejuízos, perdas. Estagnar ou declinar não faz parte dos planos de nenhum manual capitalista rumo ao sucesso. O lucro é a alma do negócio e sem alma não há vida.

Muito além da mais-valia, da tecnicidade, dos objetos, mercadorias, signos ou das relações de produção. Trata-se do equilíbrio da tríade da sociedade capitalista reforçada como ponto fixo de análise por Henri Lefebvre (p.11, 1973): a intersecção entre Terra, trabalho e capital. A demografia estará inevitavelmente no centro da discussão, seja sobre a reinvenção sistêmica do capitalismo ou na mais nova crise que o traz à beira do abismo.


O que seria da classe média na contemporaneidade se não um istmo? Estreita passagem que une dois continentes diferentes. Pressionada por ambos os lados, uma classe média sujeita a movimentos tectônicos e inundações capazes de alterar a sua configuração. Híbrida entre o céu e o inferno, a classe média é abastecida pelos interesses da burguesia. É a cordilheira perfeita para a proteção das elites, a desinformação que mantém as diferenças e consolida a desigualdade. Apenas o meio ambíguo, duplicidade de ideias e ações entre a dúvida plena e a convicção cega, não uma alternativa para sair do conflito, não uma terceira via factível. Meio sem ser ambiente, não sustentável, em cima do muro. O que será do meio com a diminuição populacional a longo prazo?

Não se pode subestimar a capacidade do capitalismo em se reinventar, mesmo quando o assunto é deflação demográfica. A cada avanço tecnológico o mesmo torna-se mais forte, cria dependência, aliena as pessoas. O determinismo social e psicológico deve ser levado em consideração. Mesmo sem resolver problemas como a pobreza, miséria, desigualdade social, má distribuição de renda, entre outros, o capital conseguiu, ao longo dos séculos, atenuar seus defeitos (mesmo que midiaticamente) e derrubar oposições.

Países como Bélgica, Suíça e Canadá já possuem incentivos para atrair indivíduos para o seu território. A tendência de queda na taxa de fecundidade está levando também à uma redução considerável da taxa de natalidade, sobretudo nos países tidos como desenvolvidos. A inserção das mulheres no mercado de trabalho, avanços tecnológicos nos métodos contraceptivos, mudanças de comportamento e a redução dos espaços de habitação nos grandes centros urbanos levaram as famílias à opção de terem menos filhos.


Se não houver o deslocamento de pessoas de regiões mais populosas para outras regiões com baixa taxa de fecundidade e de natalidade, a consequência será o envelhecimento da população e seu posterior encolhimento. Tal distribuição populacional será vital para a organização futura das nações. O ajuste demográfico passa a ser assunto central das políticas públicas.

O capitalismo precisa da cidade, precisa da urbanização, precisa de uma reserva de trabalhadores, da gentrificação, da especulação imobiliária, da conurbação urbana, da superpopulação. O capital precisa de pessoas, operários, técnicos, gerentes, precisa da natureza e do mercado, precisa modificar o meio ambiente, precisa mudar hábitos, precisa criar dependência, precisa de mais recursos, de novas máquinas, de mais consumo. O capital precisa se expandir, crescer para todos os lados nos mais diversos âmbitos.

Do mesmo modo que o crescimento exacerbado da população representou um fantasma e ainda assusta o mundo diante da escassez dos recursos naturais e da limitação da oferta diante da alta demanda, o inverso também se faz verdadeiro. Se com um boom demográfico houve uma explosão das cidades, o oposto significa um aumento na barganha e na capacidade de escolha dos cidadãos. A redução no consumo e a subutilização da estrutura urbana já edificada representam um risco para a manutenção do capital.