sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Reflexão sobre a deflação demográfica e a geografia do capital

O crescimento populacional foi exponencial em todos os continentes, passando de 600 milhões em 1700 para 7 bilhões em 2012, estimulado sobretudo pela Ásia onde atualmente é possível apontar como exemplo o caso da China, país mais populoso do mundo com quase 1 bilhão e 400 milhões de habitantes, seguida de perto pela Índia que também já superou a marca de 1 bilhão de pessoas conforme apontado por Thomas Piketty no livro O Capital do Século XXI (p.80, 2014).

Entretanto, tal fenômeno de superpopulação não se configura uma tendência mundial para os cenários dos próximos séculos. Estudar a dinâmica demográfica é fundamental para analisar a evolução da população e estimar o seu futuro com base em indicadores e taxas. Malthus (economista inglês) teorizou em 1798 que a capacidade produtiva de alimentos cresceria em progressão aritmética enquanto que a população cresceria em progressão geométrica, iniciando uma abordagem ampla para discussão sobre elementos geográficos e econômicos.


O Brasil recentemente ultrapassou a marca de 210 milhões de habitantes. Segundo projeções da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre a população brasileira, estima-se que entre 2030 e 2035 o país atingirá o seu ápice populacional com 218 milhões de habitantes e depois passará por um processo de queda demográfica que pode representar cerca de 113 bilhões já em 2100. Tal declínio se assemelha com o que é previsto para outros países neste novo milênio. A deflação demográfica já é uma realidade em estágio inicial no Japão e em alguns países da Europa Ocidental.

O sistema capitalista necessita de crescimento, seus genes contêm cromossomos de superávit diários. Lutar contra isso seria contrariar a sua própria composição. O aumento da produtividade e do consumo costumam ser as respostas do capital para sair das crises que o assola. O não crescimento significa recessão, incertezas, prejuízos, perdas. Estagnar ou declinar não faz parte dos planos de nenhum manual capitalista rumo ao sucesso. O lucro é a alma do negócio e sem alma não há vida.

Muito além da mais-valia, da tecnicidade, dos objetos, mercadorias, signos ou das relações de produção. Trata-se do equilíbrio da tríade da sociedade capitalista reforçada como ponto fixo de análise por Henri Lefebvre (p.11, 1973): a intersecção entre Terra, trabalho e capital. A demografia estará inevitavelmente no centro da discussão, seja sobre a reinvenção sistêmica do capitalismo ou na mais nova crise que o traz à beira do abismo.


O que seria da classe média na contemporaneidade se não um istmo? Estreita passagem que une dois continentes diferentes. Pressionada por ambos os lados, uma classe média sujeita a movimentos tectônicos e inundações capazes de alterar a sua configuração. Híbrida entre o céu e o inferno, a classe média é abastecida pelos interesses da burguesia. É a cordilheira perfeita para a proteção das elites, a desinformação que mantém as diferenças e consolida a desigualdade. Apenas o meio ambíguo, duplicidade de ideias e ações entre a dúvida plena e a convicção cega, não uma alternativa para sair do conflito, não uma terceira via factível. Meio sem ser ambiente, não sustentável, em cima do muro. O que será do meio com a diminuição populacional a longo prazo?

Não se pode subestimar a capacidade do capitalismo em se reinventar, mesmo quando o assunto é deflação demográfica. A cada avanço tecnológico o mesmo torna-se mais forte, cria dependência, aliena as pessoas. O determinismo social e psicológico deve ser levado em consideração. Mesmo sem resolver problemas como a pobreza, miséria, desigualdade social, má distribuição de renda, entre outros, o capital conseguiu, ao longo dos séculos, atenuar seus defeitos (mesmo que midiaticamente) e derrubar oposições.

Países como Bélgica, Suíça e Canadá já possuem incentivos para atrair indivíduos para o seu território. A tendência de queda na taxa de fecundidade está levando também à uma redução considerável da taxa de natalidade, sobretudo nos países tidos como desenvolvidos. A inserção das mulheres no mercado de trabalho, avanços tecnológicos nos métodos contraceptivos, mudanças de comportamento e a redução dos espaços de habitação nos grandes centros urbanos levaram as famílias à opção de terem menos filhos.


Se não houver o deslocamento de pessoas de regiões mais populosas para outras regiões com baixa taxa de fecundidade e de natalidade, a consequência será o envelhecimento da população e seu posterior encolhimento. Tal distribuição populacional será vital para a organização futura das nações. O ajuste demográfico passa a ser assunto central das políticas públicas.

O capitalismo precisa da cidade, precisa da urbanização, precisa de uma reserva de trabalhadores, da gentrificação, da especulação imobiliária, da conurbação urbana, da superpopulação. O capital precisa de pessoas, operários, técnicos, gerentes, precisa da natureza e do mercado, precisa modificar o meio ambiente, precisa mudar hábitos, precisa criar dependência, precisa de mais recursos, de novas máquinas, de mais consumo. O capital precisa se expandir, crescer para todos os lados nos mais diversos âmbitos.

Do mesmo modo que o crescimento exacerbado da população representou um fantasma e ainda assusta o mundo diante da escassez dos recursos naturais e da limitação da oferta diante da alta demanda, o inverso também se faz verdadeiro. Se com um boom demográfico houve uma explosão das cidades, o oposto significa um aumento na barganha e na capacidade de escolha dos cidadãos. A redução no consumo e a subutilização da estrutura urbana já edificada representam um risco para a manutenção do capital.

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