sábado, 13 de agosto de 2016

Reflexão sobre o governo interino

Três meses após o afastamento da presidente Dilma Rousseff de suas funções, iniciou-se o chamado governo Temer que desde o início se envolveu em polêmicas. Agora, na reta final do processo de impeachment, a probabilidade do governo interino deixar o poder é mínima. Entretanto, é preciso refletir sobre os motivos desse processo e suas consequências. Afinal, trata-se de uma alteração por influências, carregada de estigma e paradigma, em que a mudança em si não significa um avanço social nacional.

O fator determinante para o processo de impedimento está na falta de controle e de apoio do governo Dilma para com o Congresso Nacional. Mesmo este sendo bicameral, a presidente obteve ampla derrota em ambas as casas. Muito se fala das famosas pedalas fiscais, mas creio que este seja apenas o argumento encontrado pelos opositores para utilizar como base para a retomada do poder. Afinal, pedalas fiscais houveram nos governos anteriores ao da presidente Dilma e pedidos de impeachment também (e não foram poucos). Porém, nem as pedalas anteriores, nem os pedidos de impedimentos anteriores tiveram sequência. Isso porque nos casos anteriores os governos detinham forte influência política, garantindo maioria no Congresso Nacional. Desse modo, é possível concluir que o motivo para o afastamento definitivo do governo Dilma é a falta de articulação política e não necessariamente os crimes cometidos pela sua equipe.

O processo de impeachment é político e no caso atual isso torna-se claro. Na época do governo Collor, o então presidente em exercício cometeu o crime, de modo que a compreensão dos fatos e do processo foi mais simples, tanto para as instituições quanto para a população. Porém, agora o crime está na gestão, o que causa um racha na opinião pública. O fato é que das outras duas vezes em que os vices assumiram o poder (José Sarney em 1985 e Itamar Franco em 1992) tiveram participação ativa somente após o fato consumado (no caso do Sarney foi a morte de Tancredo e no caso do Itamar foi a renúncia de Collor após a abertura do processo de impeachment). Já no caso de Michel Temer, o mesmo teve participação ativa antes mesmo do processo de impedimento, responsável pelo racha na base do próprio governo alegando descontentamento com as medidas de um governo do qual ele sempre fez parte. Portanto, Michel Temer agiu nos bastidores, antes mesmo do impeachment, e age agora para sacramentar a tomada do poder.

Para obter tal sucesso no processo de impedimento, Michel Temer teve que se submeter politicamente para angariar apoio, manchando o seu governo logo no início ao fazer escolhas políticas ao invés de escolhas técnicas para os cargos de ministros. O pior dessas escolhas está no fato de serem políticos com a ficha suja, contrariando as manifestações anticorrupção que ocorrem no país desde 2013. Como não lembrar de Romero Jucá, Fabiano Silveira e Henrique Alves? As denúncias da Lava Jato chegaram também diretamente à pessoa de Michel Temer com acusações de pedido de recursos ilícitos para a campanha de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo em 2012. Ou seja, se queremos uma política limpa e justa estamos no caminho errado.

Outra questão que deve ser levantada é que Michel Temer integrou o governo Dilma desde o início, sendo vice nas eleições de 2010 e 2014. Mais ainda: o PMDB foi vice do PT desde a era Lula em 2002. É estranho pensar em um rompimento político de uma aliança de longa data tão próximo das eleições. Afinal, se o PMDB e o Michel Temer estavam insatisfeitos com o governo Dilma, não deveriam estar na mesma coligação em 2014. No momento em que o governo mais precisava, em que a pressão das manifestações aumentaram sobre o governo Dilma e a crise econômica mostrou suas garras, o PMDB pega suas coisas e abandona um aliado de mais de uma década. Amigos apenas nos bons momentos? Insatisfeitos com as denúncias da Lava Jato, sobretudo o então presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, o PMDB abandonou o governo e disparou contra os antigos aliados, almejando a queda do PT e a retomada do poder. Movidos pela ganância, não bastava demonstrar sua fraqueza abandonando uma parceria na hora em que mais se precisava de apoio, mas também colocaram-se na oposição, contra o governo que eles mesmos fizeram parte e ajudaram a construir. Literalmente um tiro no pé. É impossível o PMDB alegar imparcialidade na gestão tanto do governo Lula quanto do governo Dilma. O PMDB fez uma aliança com os seus antigos opositores; afinal, o inimigo do meu inimigo é meu amigo. Desse modo, o PMDB demonstra uma oposição mais dura em poucos meses do que foi a oposição do PSDB ao longo de anos.

Já no governo interino, Michel Temer prometeu mudanças. Mas de fato, quais foram as mudanças? O número de desempregados só aumenta, os gastos públicos também. Aumento de salários para alguns cargos públicos, alinhamento com o empresariado e sinalização de mudanças, para pior, nas questões trabalhistas. No momento a melhora social continua só no discurso, buscando o apoio dos capitalistas para a melhora da economia, onde estes teriam ainda mais vantagens no nosso país subdesenvolvido. O medo é o da perda de direitos já adquiridos. O que se esperar de um governo refém de uma classe política manchada? Não me esqueço da campanha eleitoral de baixo nível para a presidência realizada em 2014. Mentiras foram ditas de ambos os lados e se o PMDB fazia parte de um desse lados, então concluo que o mesmo está acostumado à mentiras.

Para finalizar o raciocínio, gostaria de deixar claro a participação do governo interino nos governos anteriores. Isso não significa que o governo Dilma esteja isento de culpa na má administração federal, mas foi vítima da traição dos que estão no poder porque, no final das contas, o PMDB dança conforme a música para se manter no topo, mesmo sem ter candidatos. Creio que a mudança tão esperada pelos brasileiros venha da Lava Jato e não do governo Temer. Não posso deixar de citar um sentimento que tenho de que há um componente machista em toda essa ação. 

É possível concluir que mudaram as peças, mas a política brasileira continua a mesma. A diferença pode ser feita pela sociedade e pelo judiciário, não pelo governo Temer. Mesmo com as mudanças, tenho a sensação de que o status quo permanece, repleto de estigmas e paradigmas.





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