É fato que o resultado da última eleição demonstra uma nova tendência política de representação nos mais distintos municípios do país e causa uma certa ruptura no que vinha se construindo nos últimos doze anos. É inegável que uma tsunami azul atingiu o Brasil, mesmo nas regiões em que não existe mar. É inquestionável também que o vermelho tornou-se desbotado, muito pela mancha revelada na operação Lava Jato. Entretanto, não houveram mudanças de fato, ainda mais em um cenário em que a sociedade civil organizada ocupa as ruas desde 2013 clamando por inovação. Nesse sentido podemos considerar que o resultado concretizado no último domingo na verdade reflete mais do mesmo.
Vamos começar com os "vencedores". Sobre isso destaco o avanço do PSDB que passou de 695 prefeituras em 2012 para 803 prefeituras agora em 2016, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Isso representa mais de 15% de crescimento, sendo o maior aumento percentual dentre os grandes partidos do país. Alguns analistas políticos apontaram o PMDB como vencedor, tendo em vista sua liderança numérica referente à quantidade de prefeituras ocupadas, conquistando 1038 cidades. O número do PMDB é expressivo, mas considero como estagnação ao invés de vitória, tendo em vista que este partido de centro tem histórico notório em quantidade de cadeiras, o que não significa qualidade, nem mesmo aumento de relevância nas maiores metrópoles do país. Se compararmos com 2012, o PMDB teve um singelo crescimento de pouco mais de 1%.
De um modo geral, a direita conservadora sai vitoriosa das urnas, com destaque para a ascensão dos evangélicos através da figura de Marcelo Crivella que venceu a disputa na cidade do Rio de Janeiro. Geraldo Alckmin é outra face que pode ser apontada como vitoriosa, pois mesmo sem concorrer a nenhuma prefeitura viu suas apostas políticas vencerem as disputas em que participaram, com destaque para a eleição em primeiro turno do empresário João Doria a capital de São Paulo. Desse modo, Alckmin se fortalece para o cenário eleitoral de 2018, tanto externamente quanto dentro do partido. Vale ressaltar também a vitória do PSDB em Porto Alegre, o que há alguns anos atrás parecia impensável.
Já sobre os "perdedores" não há tanta divergência entre os analistas em apontar o PT que foi de 638 prefeituras em 2012 para apenas 254 prefeituras em 2016, resultando em uma queda de 60%. Essa queda é ainda mais drástica tendo em vista a perda das principais metrópoles que antes eram petistas e, sobretudo, a perda do chamado cinturão vermelho que existia no ABC, reduto do partido. A derrota percentual do PT está entre as maiores, não se restringindo apenas ao grandes partidos.
De um modo geral, me arrisco a dizer que a centro-esquerda sai derrotada e não a esquerda, como anunciado amplamente pelos meios de comunicação de massa. Isso porque creio que partidos como PT e PC do B não representem a real esquerda política. Entendo que na contemporaneidade a dualidade entre direita e esquerda está enfraquecida, gerando uma verdadeira confusão ideológica em que partidos tornam-se vitrines de consumo e o produto são os seus respectivos candidatos. A pauta política transformou-se em plataforma de publicidade e marketing, deixando de lado programas públicos realistas e de interesse de todos. Para um anarquista que defende a Anarquia Democrática Social, o fato de exercer o direito político somente por meio da escolha de um outrem me parece mais um sistema eleitoral elitista (cujo voto é obrigatório e representativo, não havendo a participação ativa do cidadão no meio político) do que propriamente democrático (soberania do povo).
Assim sendo, considero que a esquerda permanece ocupando o espaço minoritário que já ocupava, com boas perspectivas futuras, sobretudo em torno do PSOL e possíveis alianças entre esquerda e centro-esquerda, formando juntos uma forte coalizão capaz de barrar o crescimento conservador que se multiplica atualmente em todo o mundo. Posso citar como derrotado também o presidente do PSDB Aécio Neves que a cada dia que passa parece perder sua relevância nacional, regional (em Minas Gerais) e, consequentemente, dentro do próprio partido.
Como projeção para 2018 vejo uma disputa acirrada dentro do PSDB entre caciques antigos: Aécio, Alckmin e Serra. Além disso, vejo que o governo de Michel Temer encontra-se em dificuldades para que o PMDB lance algum candidato forte para 2018 com chances reais de vitória. Isso porque o maior aliado de Temer no momento é o PSDB e não o PMDB que mostrou a sua face traiçoeira (além de tomar o poder de um antigo aliado) na própria votação do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, caçando-a, porém mantendo os seus direitos políticos. Qual o interesse do PSDB com esse apoio? Parece-me óbvio: forçar o então presidente Temer a tomar medidas pesadas e antipopulares para que desse modo desgaste o seu governo e deixe o caminho livre para que os mesmos possam assumir em 2018. Postergar as reformas necessárias não é interessante para quem almeja o poder nas próximas eleições.
Com isso reforço a minha ideia de que é necessária uma reforma no sistema político, transferindo os poderes legislativo e executivo para o povo no qual o judiciário seria o ponto de equilíbrio no que tange aos direitos universais e na proteção das minorias. O futuro do país continua mais nas mãos do judiciário do que nessa onda de candidatos que se auto intitulam "não políticos". É fato que governar significa administrar, mas o fato de empresários tentarem se desvincular à imagem de políticos tradicionais não melhorará a política, tentando tapar o sol com a peneira. Do modo que estamos hoje, muda-se a persona, mas a cultura filosófica enraizada na profissão política se manterá em sua generalidade.
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