sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Reflexão sobre as atribuições do Estado

São tantas as demandas emanadas pela sociedade para com o poder público e são tantas as divisões entre as entidades federais, estaduais e municipais que me fazem refletir sobre as prioridades públicas, tendo em vista que a constituição vigente é muito ampla e os governos batem cabeça agindo mais como bombeiros para apagar o incêndio do que como governantes de fato. Isso sem contar a tripartição do poder (que será alvo de reflexões futuras). É bem verdade que nesse contexto de incompetência faz-se necessário a adição de grandes doses de corrupção e mal gerenciamento da coisa pública, seja por falta de conhecimento ou mesmo por falta de comprometimento. Entretanto, focarei esta reflexão sobre o real dever do Estado e seu contrato social.

Primeiro devemos observar a formação dos estados nacionais tais como são hoje, seu nascimento e objetivo. Sendo assim volto a conceitos de autores contratualistas para debater a real atuação do Estado perante a sociedade civil. O contrato social se estabelece a partir do momento da necessidade de convivência entre as pessoas, as quais se juntam na formação da sociedade. Desse modo, os indivíduos se agrupam com o intuito de compartilhar de forma recíproca as relações sociais, econômicas, políticas e culturais, salvaguardando direitos e obtendo deveres. Assim tem-se uma variedade de questões a serem tratadas, definidas e partilhadas entre os indivíduos e, consequentemente, uma série de atribuições ao Estado.

Porém, o cerne para a formação do Estado está no desejo mútuo de sobrevivência e necessidade de proteção do ser humano. O surgimento do Estado é legitimado por existirem ameaças internas e externas, o que reforça a centralização do uso da força para a proteção da população nacional. Assim cria-se o Leviatã, monstro bíblico utilizado como referência por Thomas Hobbes para descrever a força do Estado. De um modo simples e direto, o Estado é o consentimento de cada indivíduo em ceder parte de sua liberdade para um bem maior coletivo responsável pela preservação da espécie humana de determinada região e também das atividades por estes desenvolvidas.

O ponto de partida para os pensadores do contrato social é o jusnaturalismo, ou seja, o estado de natureza do homem. Nesse ponto há divergências: de um lado alguns alegam que o estado natural é ruim, propenso à violência, onde o homem seria o lobo do próprio homem, segundo os dizeres de Hobbes e que um ordenamento social se faz necessário para que se evite conflitos; do outro lado temos uma corrente que julga a natureza humana boa, onde o contrato social seria o degrau para a humanidade alcançar o pleno desenvolvimento, segundo Jean-Jacques Rousseau. 

A questão da origem parece-me um tanto exagerada de ambas as partes, afinal o homem em seu estado natural seguiria seus instintos assim como um leão segue os seus e não há nada de errado em matar para sobreviver, seguindo o ciclo natural da vida entre caça e caçador. O momento de ruptura é a consciência do homem de sua racionalidade e com essa consciência surgem os desejos e os medos. Porém, esta ultrapassa o simples estado de natureza do ser humano, diferenciando-o das demais espécies. Como consequência temos a sociedade e, posteriormente, o Estado. Concluo que a violência é o fazer mal estando consciente e que desse modo não há mais estado de natureza a ser discutido, mas sim princípios éticos e sociais dentro da ação em agir de forma violenta propositalmente e muitas vezes de modo desnecessário, seja contra o próprio ser humano ou mesmo para com outros seres vivos. Mesmo com o suposto contrato social vigente vivemos em permanente estado de violência, guerras e medo. 

O fato é que a razão para o Estado existir é para satisfazer a necessidade de segurança da sociedade, combatendo os seus anseios. Desse modo concluo que a função primeira para o Estado priorizar suas políticas públicas é a segurança dos cidadãos que abriram mão de parte da sua liberdade. Assim temos o tripé que defendo para o sucesso de um governo: segurança, ensino e saúde. Com a execução eficaz destes três elementos, o Estado cumpre com o seu papel principal e originário. Obviamente existem outras demandas a serem sanadas. Como exemplo posso citar o nível de interferência do Estado na economia ou políticas assistencialistas. Mas sem a garantia da soberania da vida social com condições iguais para a formação do caráter do ser humano, é impossível pensar em desenvolver outros temas, seja qual for a agenda.

A ordem social é o centro para a atuação do Estado. Pode-se concluir que o Estado brasileiro tem falhado (e muito) desde a sua criação, quando o Estado antecedeu a consciência e o espírito de sociedade civil, sendo este último "resgatado" recentemente. A própria carta magna prevê uma série de situações de modo a congestionar o campo de atuação dos governantes. É preciso focar nos resultados que façam a sociedade realmente amadurecer. Tendo as bases fortalecidas é possível partir para outros caminhos de modo a aperfeiçoar a qualidade de vida dos cidadãos. Enquanto o governo estiver mais preocupado com delações e temas midiáticos, o país continuará afogado e estagnado na lama.


domingo, 15 de janeiro de 2017

Reflexão sobre o modelo político brasileiro

O Brasil é tido oficialmente como uma república federativa presidencialista, segundo a própria constituição vigente promulgada em 1988. Os governos que por aqui passam desde então alegam serem os representantes legítimos da vontade do povo cujas instituições seguem o modelo democrático e de direito. Entretanto, o que se mostra na realidade são pequenos grupos (dentre a imensidão do país) que disputam o poder em prol do próprio interesse, cada qual no seu campo de atuação. Assim se verifica no congresso nacional com bancadas específicas, tais como a bancada da bala (representando os interesses bélicos e militares), a bancada da bíblia (representando os interesses dogmáticos das instituições religiosas), a bancada da bola (representando os interesses empresariais desportivos), a bancada dos ruralistas (representando os interesses dos latifundiários), e por assim vai. Note que por trás de cada bancada há sempre o interesse de instituições privadas e não dos interesses do povo. Quero demonstrar neste raciocínio que na verdade vivemos em uma oligarquia, ao contrário do que é defendido pelos governantes.

Primeiro temos que entender o significado de cada parte cuja união constitui (supostamente) o modelo político brasileiro: federação, república, presidencialismo e democracia. A forma de Estado mostra como o Estado está estruturado em sua totalidade, particularmente quanto aos seus modelos constitutivos. De tal modo seguimos o modelo federativo. Sendo assim, o Brasil é formado pela união indissolúvel dos estados, municípios e do distrito federal (característica esta herdada da colonização de exploração portuguesa, que manteve o Brasil uno, ao contrário da fragmentação feita pelos espanhóis no restante da América Latina). O oposto seria o modelo unitário (centralizado). Também é possível citar as confederações, onde os estados membros possuem maior soberania. 

Aqui cabe a crítica quanto a centralização de decisões nas instituições federais, tirando parte da autonomia dos estados e municípios, sobretudo em tempos de globalização, em que as respostas para as demandas exigem um curto período de tempo devido à dinâmica do sistema atual vigente na sociedade. Outra crítica para este item vai para a existência dos estados que, ao meu ver, são desnecessários. Cria-se uma hierarquia absurda, sendo que a participação dos estados na própria constituição é limitada pelas ações federais e municipais. Portanto, trata-se de uma divisão custosa e burocratizada que não oferece retorno para a população. Podemos usar como exemplo um ditado popular: cão de vários donos morre de fome (basta ter em vista a crise carcerária em que todos estão envolvidos, mas ninguém assume de fato a responsabilidade).

Referente à forma de governo adota-se a república. Refere-se ao modo pelo qual o Estado se estrutura para o exercício do poder político. O governo é a dinâmica do poder, ou seja, quem realmente governa. O governo é o agente do Estado de modo que as características do Estado se mantém enquanto os governos mudam e (teoricamente) se alternam. Como modelo oposto podemos citar a monarquia, pois trata-se de uma forma vitalícia ao invés de ser temporária. Neste este item não farei críticas, apenas uma observação: res publica vem do latim e significa coisa pública. Sobre esta ótica tenho a dizer que a gestão da coisa pública e que as tomadas de decisões não pertencem ao público de modo amplo, tal como deveria ser.

Quanto ao regime político nos estruturamos com o presidencialismo (populista e patriarcal diga-se de passagem). Diz respeito ao modo pelo qual os poderes se relacionam, sobretudo o executivo-legislativo. É também um meio de relação entre governantes e governados. É possível ter como oposto, em um paralelo comparativo, o parlamentarismo, que já foi e ainda é constantemente discutido. Independente do regime adotado, minha crítica reside no fato de eleger alguém para ter super poderes sobre a nação, independentemente se é um rei, presidente ou primeiro-ministro. O poder corrompe a todos.

Por fim, ainda no âmbito do regime político, refletiremos sobre a democracia que supostamente impera na maioria dos países. No Brasil, dizem que vivemos em um estado democrático de direito, em que as decisões são tomadas pela maioria, após a participação de todos. Dizem também que as decisões tomam forma de lei. Porém, conforme o que foi dito no parágrafo inicial sobre as bancadas no congresso, é possível assumir como verdadeiro o conceito aristotélico para oligarquia. 

Sim caro leitor, vivemos em um país oligárquico, onde o povo está saturado de trabalho para se sustentar, com longas jornadas de trabalho (sem contar o trânsito no trajeto de ida e volta). Enquanto o povo se mantém ocupado, tentando sobreviver, a elite nacional se apropria da coisa pública em busca do poder, para defender os seus interesses particulares. A democracia é apenas uma desculpa utilizada por vários países, inclusive totalitários, para serem aceitos no grupinho mundial, também conhecido como Organização das Nações Unidas. Muito fala-se contra o socialismo, sendo que este de fato foi usurpado por ditadores. Então o que dizer das democracias ditatoriais capitalistas existentes atualmente na África e Ásia? São oligarquias pois trazem consigo o vício de cada um, ao contrário do conceito de aristocracia que seria também o governo de poucos; porém aptos, justos e virtuosos para o cargo.

Desse modo concluo a minha análise sobre o conto de fadas referente ao modelo político brasileiro, vendido por muitos como um verdadeiro modelo a ser seguido. Será? Como sugestão fica a inclusão no hino nacional e na constituição federal com os seguintes dizeres: "era uma vez...".



sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Reflexão sobre o feudalismo contemporâneo

O ano de 2017 começou quente (e não me refiro somente ao calor intenso que atinge o Brasil). No primeiro dia do ano uma rebelião em Manaus resultou na morte de 56 presos no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, fruto da desavença entre facções criminosas rivais. Isso sem mencionar os fugitivos, que de tanto acontecer já não causam espanto, apenas medo. Na madrugada desta sexta-feira foram mais 33 mortos em um presídio situado em Boa Vista. O governo federal permanece inerte, agindo como bombeiro somente quando os casos vêm a conhecimento do grande público. O ministro da justiça parece perdido, mais preocupado com as entrevistas do que com a realidade do país.

A sociedade se vê atrás de grades, cada vez mais retraída, enquanto os criminosos vagam livres pelas ruas. A sensação é a de que retornamos ao feudalismo, escondidos atrás de muros e regidos por uma relação de "favor" entre senhor e vassalo, mendigando emprego e segurança para obter o mínimo necessário à sobrevivência. Dissertarei sobre a origem desse tipo de violência, mostrando que chegamos a tal situação devido a escolhas errôneas que se repetem ao longo da história.

Cada vez mais as pessoas buscam moradia em apartamentos ou condomínios fechados. Vigias particulares velam o sono da classe alta. O sentimento de insegurança é um dos principais temas levantados pela população durante pesquisas realizadas em ano eleitoral. O problema é que depois desses debates o tema perde sua relevância para a classe política, substituindo a atitude prometida por indiferença. E a violência é algo tão comum em nosso país que é tratada com naturalidade, sendo até objeto de sarcasmo quando em uma roda de amigos os participantes relatam suas experiências de roubo, furto, entre outros. Mas de cômico não há nada nessa realidade trágica. A incapacidade de destinar recursos para a formação e reabilitação de pessoas gera a epidemia da agressividade.

Para entendermos melhor esse contexto de retorno ao feudalismo é preciso ter claro em mente que a liberdade foi trocada pelo liberalismo. Com isso pretendo dizer que para alguém ganhar outro tem que perder, abrindo mão da coletividade para o individualismo. Desse modo, as ruas tornam-se a terra de ninguém, onde cada um é por si mesmo. Assim a exploração é deflagrada, criando classes opostas: a dos dominados e a dos dominadores. Essa divisão gera uma massificação nos extremos onde o trabalhador é concorrente do próprio trabalhador e o empresário é concorrente do próprio empresário, movidos pelo consumismo interno. Há o aburguesamento de parte da classe operária, perdendo assim o espírito revolucionário. Ou seja, a causa raiz desse problema social (violência) são as escolhas políticas e econômicas traçadas ao longo do tempo. O assistencialismo por meio do pagamento de um salário não traz resultados. É necessário um acompanhamento nas condições de vida desde o nascimento do indivíduo, proporcionando oportunidades boas e iguais em saúde e ensino. 

Um dos conceitos filosóficos de política descreve que a mesma procura o bem comum da cidade e que o bem é pautado por ética e virtudes, como podemos constatar nas obras de Aristóteles. Entretanto, os vícios pessoais levam a população e os governantes para um caminho em que um homem seria uma ilha por si só suficiente, o que é impossível tendo em vista a natureza social da humanidade. O contrato social proposto no final da Idade Média é falho e nunca foi concretizado de fato pelas partes envolvidas, sendo muitas vezes desviado para interesses supostamente nacionais e unilaterais. Portanto, é possível concluir que o egoísmo nunca fora superado.

O mal da violência também é econômico, pois este é um sistema que organiza a produção, distribuição e consumo, fazendo escolhas diante da escassez dos recursos. Ou seja, foram feitas as escolhas erradas (basta ver o mundo tal como está hoje). Não acredito na perfeição, mas é possível fazer políticas públicas eficazes que reduzam a violência. Esta é fruto da desigualdade social, consequência da má distribuição de renda e, sobretudo, desigualdade de oportunidades. Aí reside o fator econômico. Já o fator político está na falta de atenção ao crescimento exacerbado da população e da corrupção, sendo que o Estado é incapaz de oferecer o mínimo de saúde, educação, oportunidade de emprego e moradia de qualidade. 

Como última forma de se proteger diante do desamparo social, as pessoas se refugiam dentro de casa, com câmeras, seguros residenciais, cães, muros altos, grades em todo o perímetro, cacos de vidro, armas e o que mais estiver ao seu alcance. Não há paz nos campos e nas cidades. Vivemos reféns da incerteza e da criminalidade. Desse modo regressamos ao feudalismo medieval: devendo tributos aos senhores (bancos e governos), buscando proteção em fortalezas de concreto e desiludidos com a condição humana, acreditando na imposição dogmática das religiões como sendo a única alternativa possível de salvação.