quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Reflexão sobre a corrida eleitoral 2018

O Brasil está às vésperas do início do horário eleitoral no rádio e na tv. É bem verdade que a política não cessou nos últimos anos. Arrisco a dizer que ainda se vive as consequências de fatores que ajudam a explicar o contexto nacional atual: (a) manifestações populares e agitações de movimentos sociais de 2013 em diante; (b) crise econômica; (c) impeachment da Dilma Rousseff; (d) Lava Jato. Dentro de cada um dos itens citados acima existem subitens que trazem um maior detalhamento do cenário conturbado atual como a polarização política, a apatia do cidadão mediano, as discussões online, a falência dos estados e municípios gerando crises no sistema público, sobretudo naquilo que é sua base (segurança, educação e saúde). 

A eleição de 2018 se difere da anterior (2014) já na duração, pois houve uma redução de 90 para 45 dias, conforme o que ocorrera nas eleições regionais de 2016. Há também restrições quanto ao financiamento (doações) de empresas (pessoas jurídicas), fruto direto do trauma da corrupção escancarada pela operação Lava Jato. A poluição nas ruas tende a ser menor, pois não deverá haver placas expostas nas ruas. Entretanto, a poluição visual e sonora via redes sociais se ampliou exponencialmente. As pessoas agem freneticamente como se estivessem em uma arquibancada virtual de algum clássico de futebol agindo por impulso, de modo fanático com a propagação de propagandas e acusações repletas de fake news (a exemplo do ocorrido nas últimas eleições estadunidenses) ao invés de dialogarem.  

Bússula com bandeira do Brasil e a palavra "voto"
Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-42313908

Muito se fala sobre a necessidade de mudança, mas não é o que as pesquisas mostram. A começar pelos quadros dos partidos com velhos nomes (ou sobrenomes) do sistema público e político nacional. O fato do sistema eleitoral só permitir candidaturas via partidos é uma forma de aprisionar os cidadãos. Contudo, as contradições não se restringem às instituições. Trata-se de uma nítida divergência no seio da própria sociedade aonde a mesma população que condena a corrupção pretende eleger os mesmos candidatos/partidos que aí estão há anos.

Em um cenário aonde os dois primeiros candidatos para o cargo de presidente da república são um ex-presidente (Lula) condenado pela justiça em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro e um réu com tendências tiranas, preconceituosas e segregadoras (Jair Bolsonaro) que em 27 anos como deputado só aprovou dois projetos no Congresso e ainda é suspeito de empregar funcionária fantasma em seu gabinete. É um claro sinal de que algo está errado. Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço? 

A problemática maior não está no sistema ou nos partidos. Afinal, nenhum político está ali por acaso, todos passam pelo crivo das urnas; logo, são eleitos pela população. O fato de boa parte dos líderes das pesquisas, independente do cargo, serem velhos conhecidos envolvidos em denúncias de má gestão, desvios de verbas e apropriação indevida de recursos só mostra que as pessoas, cidadãos que compõem a sociedade, estão doentes, seja por falta de informação, seja por falta de interesse, seja por falta de conhecimentos cognitivos, jurídicos e/ou políticos. Talvez seja o caso em que a paixão fale mais alto do que a razão e isso realmente é um risco. Tão doentes ao reprovar explicitamente todo o cenário que aí está ao mesmo tempo em que mantêm o status quo.

Resultado de imagem para ibope eleições 2018
Fonte: https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/noticia/2018/08/20/pesquisa-ibope-lula-37-bolsonaro-18-marina-6-ciro-5-alckmin-5.ghtml

Outra temática de extrema relevância são as candidaturas para os cargos proporcionais (cujos candidatos são eleitos por meio do quociente eleitoral): deputados estaduais e federais. É natural que em um sistema presidencialista como o brasileiro, os cargos majoritários (cujos candidatos são eleitos por meio da maioria dos votos, seja relativa, seja absoluta) como presidente, governador e até mesmo senador possuam maior destaque pela facilidade de compreensão da população (pois vence quem obtiver a maioria dos votos) e também por certa tradição patriarcal inerente à cultura histórica brasileira. Entretanto, os deputados são fundamentais para a manutenção do chamado presidencialismo de coalizão e no repasse de verbas públicas para os estados e municípios, além das atribuições legislativas e de fiscalização da administração pública.

A relação entre eleitores e eleitos é um ciclo contínuo. Você é o reflexo do meio em que vive. Por vezes nos debates é notório o despreparo de candidatos sem uma plataforma de governo definida "jogando para a torcida" (os telespectadores). Não se trata de uma brincadeira que vence quem tiver mais curtidas ou compartilhamentos, mas do futuro da nação. O processo de avaliação criteriosa e reflexão das opções disponíveis é fundamental para a construção de um país melhor.

São 513 vagas disponíveis para deputados federais, 54 vagas para o senado, 01 vaga para presidente, 01 vaga para governador, além das vagas para deputados estaduais que variam de acordo com cada estado. Isso sem contar os vices (outro componente importante a ser observado). E todos eles, sem exceção, chegam ao poder por meio do voto. O eleitor terá direito a um voto para deputado estadual, deputado federal, governador, presidente e dois votos para senadores. 

Fonte: http://agendacapital.com.br/eleicoes-2018-presidenciaveis-devem-fechar-aliancas-perto-da-data-limite-imposta-pelo-tse/

É necessário esclarecer aqui eventuais dúvidas e alguns mitos que eleição após eleição aparecem nas conversas informais dentro do cotidiano das pessoas: (a) votos nulos não anulam uma eleição, mesmo sendo maioria. São computados somente os votos válidos; (b) os votos brancos não vão para nenhum candidato; (c) não é possível saber em quem o eleitor votou, mesmo após o período eleitoral; (d) quem não votou na última eleição não fica automaticamente impedido de votar; (e) é possível haver prisões durante as eleições sim, desde que o ato do crime seja flagrante; (f) nos casos de voto proporcional nem sempre é eleito aquele candidato que obteve mais votos; (g) a urna eletrônica não é ligada com a internet ou qualquer outro meio de transmissão de dados.

Não adianta votar pensando somente no agora levando em consideração apenas as aspirações particulares. Voto é construção, planejamento de no mínimo quatro anos cujas marcas podem se perpetuar (positiva ou negativamente) com o passar do tempo. Promessas sem propostas concretas e transparentes são apenas palavras ao vento. Pesquise a carreira dos candidatos, os atos (e não apenas a retórica), pesquise o histórico do partido, os prós, os contras, o programa de políticas públicas, as especificações de onde virão os recursos, os efeitos de cada proposta. Em média, o tempo de votação por meio da urna eletrônica leva um pouco mais de um minuto, mas o processo de escolha pode durar oito longos anos para senadores e quatro anos para os demais. 

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Reflexão sobre ditaduras

Ditaduras, caro leitor, assim mesmo, com "s" no final. Em meio à disputa eleitoral dentro do espectro político existe um modelo (uma sombra) capaz de unir posicionamentos antagônicos transportando diferenças para um plano secundário: o regime ditatorial. O motivo pelo qual o título está no plural remete à existência de diferentes configurações dentro do próprio autoritarismo cuja pluralidade impositiva resulta em um mesmo ponto comum: a estagnação. Ditaduras deságuam no mesmo oceano da ruptura evolutiva. 

De um modo geral, ditadura é um regime de governo que centraliza todos os poderes do Estado, seja em um indivíduo, grupo político ou partido; portanto, sem participação social. Há concentração de poder em uma só instância, tornando tanto a sociedade quanto o Estado reféns. Pode-se até definir ditadura como a captura e/ou extinção das instituições; ou seja, a doença que leva a democracia ao óbito. É possível acrescentar, segundo o site Significados, que em sentido figurado a palavra ditadura serve para descrever uma situação em que alguém exerce uma autoridade absoluta. 

Desse modo, o balanceamento teórico oriundo da democracia entre executivo, legislativo e judiciário é quebrado por um regime totalitário cuja ordenação é a vontade única e exclusiva dos detentores do poder, também conhecido como tirania (com base nas classificações platônicas e aristotélicas). Tal soberano é a personificação da lei e não aceita o contraditório. Assim sendo, não há espaço para pensamentos divergentes, manifestações ou qualquer tipo de reivindicações. O opositor não passa de um alvo a ser exterminado para o domínio do soberano. Sem diálogos, sem deliberações, apenas uma verdade absoluta que reduz a própria sabedoria humana.

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Fonte: http://www.livrosepessoas.com/2014/11/03/15-artistas-e-obras-que-foram-censuradas-na-ditadura-militar/

Em tempos em que alguns grupos clamam por ordem e progresso demonstrando apoio explícito às ditaduras deve-se ter cautela, pois a mão que afaga é a mesma que afoga. Se ditadura é a imposição da vontade unilateral entre os atores envolvidos na luta pelo controle total, então pode-se estabelecer uma tipologia: militar, civil-revolucionária, institucional ou dogmática. Ditaduras são um fim em si mesmas, pois levam a um mesmo processo de afastamento, desinformação (manipulação dos fatos e versões), controle rígido e, por fim, ignorância em massa. Entretanto, é possível esmiuçar as partes para que se possa entender o todo.

A ditadura militar é a mais conhecida e o próprio nome já diz tudo: a tomada de poder por meio da organização de militares. Neste caso não há o que estender na explicação, sobretudo pela experiência vivida no Brasil e América Latina como um todo. A ditadura civil-revolucionária é formada por cidadãos comuns que tomam o poder por meio da revolução armada como o ocorrido na Revolução Francesa (1789), Revolução Russa (1917) e Revolução Cubana (1959). A ditadura institucional é aquela que usa das regras, leis, cargos formais ou mesmo apelo popular para ampliar os próprios poderes dentro de um suposto cenário de legalidade e/ou legitimidade como é o caso da ditadura bolivariana da Venezuela. A ditadura dogmática é aquela que se baseia no poder divino cuja principal característica é a união entre política e religião, como o caso do Irã e da Arábia Saudita.

Ditadura Militar
Fonte: http://www.cartaeducacao.com.br/cultura/carta-professor/cinzas-lembrancas/

Geralmente associa-se às ditaduras o caráter militar, o que particularmente discordo. Ciente de que historicamente o uso das armas por meio de guerras e revoluções é o modo mais característico que corresponde às ditaduras, há também a ditadura institucional sendo obtida por golpes de estados orquestrados sem a necessidade de tiros ou uso da força com a presença de tanques nas ruas, pautando-se ora pela defesa dos direitos, ora pela omissão de deveres. Como dito anteriormente, ditadura é ditadura independentemente da cor da bandeira. 

A ditadura teve sua origem como tal no Império Romano quando, em situações de extrema urgência, a república dissolvia-se momentaneamente para a concentração dos poderes em uma só pessoa para a resolução dos problemas e, após a normalização da situação, o poder republicano era restabelecido em Roma. O ditador era designado pelos cônsules e seu período de atuação não poderia ultrapassar seis meses sendo que o mesmo responderia por seus atos perante a lei tendo que se justificar após o período da ditadura. Mas o poder corrompe e após o século II a.C. as ditaduras perderam seu caráter legal, posteriormente resultando na queda do império. Séculos depois é possível citar o absolutismo monárquico, ditaduras exercidas por reis.

 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia/210021-1

Costuma-se associar as ditaduras aos movimentos de esquerda, claramente tratando-se de uma afirmação inverídica. Como classificar o Império Romano? O absolutismo europeu, baseado no mercantilismo, ocorreu na fonte do capitalismo. O tema foi motivo de divergência entre anarquistas (contrários à ditadura) e comunistas (favoráveis). Ouso afirmar que a chamada ditadura do proletariado foi um dos motivos que levaram à queda do comunismo ao redor do globo. O que dizer das ditaduras de mercado livre na África e no Oriente Médio?

O que as ditaduras possuem em comum mesmo apesar dos diferentes contextos? O fator que une Coréia do Norte, Arábia Saudita, Síria, Omã, Egito, Irã, Venezuela e tantas outras ditaduras que existiram ou ainda existem é a estagnação. Parados no tempo, imersos no unilateralismo e isolados do restante do mundo para que os seus ditadores possam manter o controle e a manutenção do poder por meio do autoritarismo governamental. Volto a dizer: Estado e sociedade reféns, parados no tempo, estagnados seja socialmente, politicamente e/ou economicamente. Pedir por ditaduras é atestar a própria incompetência na resolução de problemas, é abdicar da capacidade de diálogo e da construção cidadã.

Estagnação, submissão e ignorância. Não é necessário expor mais nada.

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Reflexão sobre a influência emedebista na política nacional

Em uma sociedade tida como democrática, neoliberal, capitalista e globalizada seria comum a concorrência e consequente alternância de poder em prol da competitividade. Entretanto, em uma oligarquia representativa como a brasileira é possível constatar o monopólio de empresas dentro da esfera privada (nacionais como Petrobrás, JBS, Odebrecht ou internacionais como Coca-Cola, PepsiCo, montadoras automobilísticas, etc.) e a predominância de certos partidos dentro da esfera pública. O resultado é lógico: concentração de poder e desigualdade.

Dentro do âmbito político é necessário fazer um recorte temporal para que esta reflexão não se estenda demasiadamente. Pois bem, partindo do período de redemocratização até os dias atuais (1985-2018) é possível citar a relevância de três grandes partidos dentro do cenário brasileiro: PT (Partido dos Trabalhadores), PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) e MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Muito se fala da polarização entre esquerda e direita, azuis e vermelhos, petistas e tucanos, mas pouco se comenta sobre a influência emedebista na política nacional.

Tal predominância do MDB vem desde os tempos da ditadura militar (1964-1985) quando os militares dissolveram todos os partidos existentes criando um bipartidarismo nacional entre o partido do então governo militar ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e a oposição composta pelo MDB que aglutinou membros de outros partidos. Com o fim do militarismo este mudou de nome para PMDB e predominou como maior partido desde então. 

Fonte: http://www.caaraponews.com.br/noticia/88726/pmdb-volta-a-ser-mdb

Para comprovar a abrangência emedebista vamos aos dados: (a) 20 senadores são emedebistas de 81 cadeiras disponíveis sendo o maior partido da câmara alta com 25% do total; (b) 61 deputados federais são do partido sendo também o maior da casa - câmara baixa; (c) possui mais de 2 milhões de filiados tornando-se o maior partido do Brasil; (d) 7 dos governadores são emedebistas, o que representa 1/4 do total; (e) o atual presidente do país (cargo máximo do poder executivo) pertence ao MDB; (f) o presidente do senado Eunício Oliveira é emedebista; (g) o presidente da câmara Rodrigo Maia pertence ao Democratas, aliado do MDB dando totais subsídios para sua governabilidade; (h) em 2016 o MDB manteve sua hegemonia sendo o partido que mais elegeu prefeitos em todo o território nacional conquistando 1028 prefeituras.

Vale lembrar que desde a redemocratização nacional, o MDB sempre esteve presente no governo federal mesmo sem eleger diretamente um presidente sendo o fator decisivo na balança para a governabilidade do país em um contexto multipartidário que hoje conta com mais de 35 partidos. Tal capilaridade é notada tanto no poder executivo quanto no legislativo, atingindo os três entes federativos: municípios, estados e União. Trata-se de um partido que domina a política nacional, seja de forma direta por meio das eleições, seja nos bastidores. Portanto, é possível concluir que dentro do recorte temporal feito o MDB é a atual elite política brasileira mantendo o país ao centro, sem permitir que a nação descambe para os extremos. 

O depoimento envolve contrato que, segundo a Odebrecht e os investigadores, beneficiou o MDB em 2010, em suposto acerto com políticos do partido, no escritório de Temer em SP.
Fonte: http://domtotal.com/noticia/1260100/2018/05/operador-emedebista-confessa-crime-e-entrega-us-7-5-milhoes/

As principais ocupações dentro do MDB no Congresso Nacional, conforme o artigo "Elite Política Brasileira e a Manutenção do Poder por meio da Oligarquia Representativa: a Influência Emedebista" deste mesmo autor, são de profissionais autônomos e liberais como advogados, empresários e médicos, reforçando as tradições históricas da classe dominante do Brasil composta geralmente por empresários, juristas, latifundiários e militares. Nada de novo na exclusão do povo. Um exemplo é o fato que em 2016, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) apenas 14% dos brasileiros possuíam ensino superior completo. Seria a nata política tomando decisões (e omissões) para a manutenção do poder e desinformação da população gerando apatia e conflitos sociais. 

É possível notar a continuidade de tradições patrimonialistas, clientelistas, corporativistas e nepotistas reforçadas pelos partidos que predominam o cenário político brasileiro que se utilizam do pretexto de democracia representativa. Como alternativas para combater o desvio da política e do bem público estão: pesado investimento em ensino (qualificação pessoal e profissional) e a participação popular por meio de plebiscitos, referendos, voto não obrigatório e candidaturas independentes. Não há fórmula mágica, apenas vontade política em instalar uma democracia de fato no país e não essa desculpa teórica que aí está para obtenção de interesses privados fazendo da democracia pura demagogia popular de sofistas.

domingo, 5 de agosto de 2018

Reflexão sobre a Base Nacional Comum Curricular

O ensino é praticamente uma unanimidade nas agendas dos cidadãos e candidatos aos cargos eletivos. O discurso é realmente comovente, mas é necessário ir aos fatos, ser concreto e pragmático. A proposta vigente oriunda do atual governo federal é a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) vinda de cima para baixo por meio de Medida Provisória (MP) do excelentíssimo e ilegítimo presidente como parte de suas mirabolantes reformas para o Brasil. A mesma é vendida pela equipe do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) como a salvação da nação. Cuidado com as propagandas, pois tal urgência pode ser um verdadeiro retrocesso escolar.

A proposta visa reformar o Ensino Médio propondo uma flexibilização da grade curricular atual com vistas a permitir ao estudante escolher uma área de conhecimento para aprofundar os estudos, conforme descrito no Portal do MEC (Ministério da Educação). Assim sendo, o governo propõe tornar obrigatórias somente as disciplinas de língua portuguesa e matemática nos três anos do Ensino Médio dividindo as demais matérias em eixos que serão ofertados aos alunos.

Pois bem, o primeiro questionamento que se faz, dentro da própria descrição do MEC, é qual seria o aprofundamento? Aprofundamento em quê, levando-se em conta que a proposta é uma subtração das disciplinas e não uma adição de outras matérias? O cerne do questionamento é uma questão lógica: se o ensino é tão importante, então por que cortar disciplinas ao invés de acrescentar opções para assim oferecer um verdadeiro aprofundamento do conhecimento?

Fonte: http://www.sinteps.org.br/noticias/946-mp-746-2016-porque-a-reforma-do-ensino-medio-precisa-ser-combatida

Outra pergunta que se coloca é qual o motivo da pressa do governo em impor tais reformas goela abaixo sem um amplo debate entre ONGs voltadas ao ensino, escolas públicas e privadas, empresas particulares que poderiam apoiar com recursos (financeiros, materiais e humanos), instituições públicas, governos municipais e estaduais? Se é para o bem geral da nação, então por que não ouvir ampla e diretamente os principais envolvidos (pais, alunos e professores)? A urgência em se aprovar a BNCC é maior do que a urgência em se discutir e reformar verdadeiramente o ensino médio brasileiro. 

Sobre os itinerários propostos há uma divisão em cinco eixos: Linguagens, Exatas, Ciências Humanas, Ciências da Natureza e Ensino Profissional. Porém, as escolas serão obrigadas a ofertar apenas um itinerário. Ou seja, se a escola do aluno ofertar apenas Exatas e o mesmo desejar Humanas, ele (aluno) terá que se descolar até uma escola que tenha a grade desejada (isso se tiver vaga disponível). A lei também não esclarece quando as outras disciplinas (não obrigatórias nos três anos do ensino médio como física, química, história, geografia, biologia, etc.) serão cursadas. Note caro leitor que se trata de um projeto de reforma incompleto, repleto de buracos.

Fonte: http://www.pensamentoradical.com/2017/09/trabalho-hfe-3-ano-3-bimestre-2017-iecd.html

A carga horária obrigatória praticamente dobrará visando estimular o ensino integral. Até aí sem nenhum problema. Entretanto, a lei não determina que todas as escolas terão o Ensino Médio Integral, inclusive sendo discutido pelo CNE (Conselho Nacional de Educação) o Ensino à Distância (EAD) para cerca de 40% da carga horária. Pergunta: conhecendo o país e suas deficiências, será que todos os alunos terão acesso a computadores e internet para realizar disciplinas EAD? Será que haverá tutores qualificados por todo o Brasil tendo-se em vista que a proposta busca substituir licenciaturas e especializações por notório saber? Em pleno período de desemprego a proposta do governo visa desempregar professores. 

Há de se pensar também no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), pois a Base Nacional Comum Curricular não especifica como será realizada tal avaliação. Vale aqui lembrar que atualmente o ENEM é realizado em dois dias cujas provas são divididas por disciplinas e não por eixos. Caberá às escolas, municípios e estados se adequarem sobre qual (is) eixo (s) será (ão) ofertado (s) e se o mesmo será em tempo integral ou EAD. Ué, mas não era para ser uma Base Nacional Comum, uniforme no país, unificada, capaz de centralizar o currículo e oferecer igualdade em oportunidade aos estudantes? Com tantas brechas na lei o assunto tornou-se uma verdadeira zona, assim como as demais reformas propostas pelo governo usurpador do MDB na esfera federal. 

Fonte: http://espacosocialista.org/portal/2016/11/jornal-95-reforma-do-ensino-medio-intensificar-a-competicao-e-abalar-a-solidariedade-para-entregar-o-publico-ao-privado/

De onde virão os recursos? Quem pagará a conta tendo-se em vista que a União vem cortando verbas destinas à pesquisa e tecnologia ao longo dos últimos dois anos devido à crise? Está previsto um investimento de R$1,5 bilhão até 2018 do governo federal. De onde virá essa verba, já que o próprio governo mal consegue administrar as contas públicas? Os alunos terão café da manhã, almoço, café da tarde? E os professores? Impor um sistema de ensino privilegiando determinadas disciplinas é hierarquizar o conhecimento conforme interesses obscuros, fracionar a inteligência, alienar o foco.  

Não seria interessante manter as disciplinas que aí estão e adicionar novos eixos como forma complementar? Não seria interessante ofertar também aulas de artes marciais, xadrez, música, noções de economia familiar, manutenção básica residencial, noções de direito, introdução à ciência política, etc.? Não seria interessante concatenar o Ensino Médio ao ingresso no Ensino Superior privilegiando assim a meritocracia construída ao longo de três anos ao invés de submeter isso a dois dias de provas? Que é preciso melhorar o ensino de um modo geral no Brasil não se discute; o problema é o modo de como as decisões estão sendo tomadas, sem ampla participação social.