quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Reflexão sobre ditaduras

Ditaduras, caro leitor, assim mesmo, com "s" no final. Em meio à disputa eleitoral dentro do espectro político existe um modelo (uma sombra) capaz de unir posicionamentos antagônicos transportando diferenças para um plano secundário: o regime ditatorial. O motivo pelo qual o título está no plural remete à existência de diferentes configurações dentro do próprio autoritarismo cuja pluralidade impositiva resulta em um mesmo ponto comum: a estagnação. Ditaduras deságuam no mesmo oceano da ruptura evolutiva. 

De um modo geral, ditadura é um regime de governo que centraliza todos os poderes do Estado, seja em um indivíduo, grupo político ou partido; portanto, sem participação social. Há concentração de poder em uma só instância, tornando tanto a sociedade quanto o Estado reféns. Pode-se até definir ditadura como a captura e/ou extinção das instituições; ou seja, a doença que leva a democracia ao óbito. É possível acrescentar, segundo o site Significados, que em sentido figurado a palavra ditadura serve para descrever uma situação em que alguém exerce uma autoridade absoluta. 

Desse modo, o balanceamento teórico oriundo da democracia entre executivo, legislativo e judiciário é quebrado por um regime totalitário cuja ordenação é a vontade única e exclusiva dos detentores do poder, também conhecido como tirania (com base nas classificações platônicas e aristotélicas). Tal soberano é a personificação da lei e não aceita o contraditório. Assim sendo, não há espaço para pensamentos divergentes, manifestações ou qualquer tipo de reivindicações. O opositor não passa de um alvo a ser exterminado para o domínio do soberano. Sem diálogos, sem deliberações, apenas uma verdade absoluta que reduz a própria sabedoria humana.

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Fonte: http://www.livrosepessoas.com/2014/11/03/15-artistas-e-obras-que-foram-censuradas-na-ditadura-militar/

Em tempos em que alguns grupos clamam por ordem e progresso demonstrando apoio explícito às ditaduras deve-se ter cautela, pois a mão que afaga é a mesma que afoga. Se ditadura é a imposição da vontade unilateral entre os atores envolvidos na luta pelo controle total, então pode-se estabelecer uma tipologia: militar, civil-revolucionária, institucional ou dogmática. Ditaduras são um fim em si mesmas, pois levam a um mesmo processo de afastamento, desinformação (manipulação dos fatos e versões), controle rígido e, por fim, ignorância em massa. Entretanto, é possível esmiuçar as partes para que se possa entender o todo.

A ditadura militar é a mais conhecida e o próprio nome já diz tudo: a tomada de poder por meio da organização de militares. Neste caso não há o que estender na explicação, sobretudo pela experiência vivida no Brasil e América Latina como um todo. A ditadura civil-revolucionária é formada por cidadãos comuns que tomam o poder por meio da revolução armada como o ocorrido na Revolução Francesa (1789), Revolução Russa (1917) e Revolução Cubana (1959). A ditadura institucional é aquela que usa das regras, leis, cargos formais ou mesmo apelo popular para ampliar os próprios poderes dentro de um suposto cenário de legalidade e/ou legitimidade como é o caso da ditadura bolivariana da Venezuela. A ditadura dogmática é aquela que se baseia no poder divino cuja principal característica é a união entre política e religião, como o caso do Irã e da Arábia Saudita.

Ditadura Militar
Fonte: http://www.cartaeducacao.com.br/cultura/carta-professor/cinzas-lembrancas/

Geralmente associa-se às ditaduras o caráter militar, o que particularmente discordo. Ciente de que historicamente o uso das armas por meio de guerras e revoluções é o modo mais característico que corresponde às ditaduras, há também a ditadura institucional sendo obtida por golpes de estados orquestrados sem a necessidade de tiros ou uso da força com a presença de tanques nas ruas, pautando-se ora pela defesa dos direitos, ora pela omissão de deveres. Como dito anteriormente, ditadura é ditadura independentemente da cor da bandeira. 

A ditadura teve sua origem como tal no Império Romano quando, em situações de extrema urgência, a república dissolvia-se momentaneamente para a concentração dos poderes em uma só pessoa para a resolução dos problemas e, após a normalização da situação, o poder republicano era restabelecido em Roma. O ditador era designado pelos cônsules e seu período de atuação não poderia ultrapassar seis meses sendo que o mesmo responderia por seus atos perante a lei tendo que se justificar após o período da ditadura. Mas o poder corrompe e após o século II a.C. as ditaduras perderam seu caráter legal, posteriormente resultando na queda do império. Séculos depois é possível citar o absolutismo monárquico, ditaduras exercidas por reis.

 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia/210021-1

Costuma-se associar as ditaduras aos movimentos de esquerda, claramente tratando-se de uma afirmação inverídica. Como classificar o Império Romano? O absolutismo europeu, baseado no mercantilismo, ocorreu na fonte do capitalismo. O tema foi motivo de divergência entre anarquistas (contrários à ditadura) e comunistas (favoráveis). Ouso afirmar que a chamada ditadura do proletariado foi um dos motivos que levaram à queda do comunismo ao redor do globo. O que dizer das ditaduras de mercado livre na África e no Oriente Médio?

O que as ditaduras possuem em comum mesmo apesar dos diferentes contextos? O fator que une Coréia do Norte, Arábia Saudita, Síria, Omã, Egito, Irã, Venezuela e tantas outras ditaduras que existiram ou ainda existem é a estagnação. Parados no tempo, imersos no unilateralismo e isolados do restante do mundo para que os seus ditadores possam manter o controle e a manutenção do poder por meio do autoritarismo governamental. Volto a dizer: Estado e sociedade reféns, parados no tempo, estagnados seja socialmente, politicamente e/ou economicamente. Pedir por ditaduras é atestar a própria incompetência na resolução de problemas, é abdicar da capacidade de diálogo e da construção cidadã.

Estagnação, submissão e ignorância. Não é necessário expor mais nada.

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