Vergonha. Talvez seja pouco para representar a insatisfação social para com os três poderes do Brasil. A virtude política que deveria ser símbolo de um país republicano segundo Montesquieu se afoga em um mar de desvios, corrupção e perda de direitos. Outro ano que entra para a estatística de um período politicamente perdido, mas não deve ser esquecido como muitos desejam; pelo contrário, os erros devem ser assimilados e corrigidos. A descrença no establishment só aumenta e neste ano de 2017 atingiu em cheio o poder judiciário, ruindo assim as bases da tripartição dos poderes. E para 2018? Se não mudar o sistema não haverá nada de novo, apenas mais do mesmo.
Corrupção. Talvez a palavra do ano no dicionário nacional. Vale aqui destacar os avanços e vitórias conquistadas pela Operação Lava Jato. A novidade, se compararmos com o ano passado, é a forte ofensiva da classe política contra a chamada judicialização. Assim como na física, há uma força equivalente no sentido contrário ocasionando a politização do judiciário. Mas se por um lado os políticos estão se unindo para combater a "ameaça da limpeza", do outro lado há um fragmentação entre as instituições. Tal sintoma torna-se explícito entre Polícia Federal, Ministério Público e STF.
Afinal, se alguém manda prender um corrupto basta acionar o Gilmar Mendes que o mesmo prontamente entra em ação para soltar. A dualidade por si só divide as pessoas. Foi assim no início do cristianismo onde foram travadas violentas batalhas entre os que acreditavam na divindade de nascença de Jesus e aqueles que defendiam que Jesus nasceu homem e se tornou divino após receber o Espírito Santo. A dualidade é inerente da humanidade, mas não traz benefícios quando extremada. O ponto do equilíbrio se perde quando não há mais deliberação.
Mais de dois mil anos se passaram e a questão entre judeus e muçulmanos permanece, não só no âmbito de crenças religiosas, mas também no âmbito político. De um lado Israel, do outro a Palestina; de um lado Trump, do outro Putin; de um lado a esquerda, do outro a direita; de um lado o Oriente, do outro o Ocidente. A unidade de pensamento de massa e a dualidade conflitante exacerbada se misturam com a intolerância. Basta ver a elevação de casos de racismo e preconceito. O outro é posto como errado e, consequentemente, como inimigo. O ideal seria o caminho do meio, conforme Aristóteles. A verdade absoluta não existe e sua imposição termina qualquer forma de diálogo. Acreditar somente na própria razão é excluir um oceano inteiro de possibilidades, horizontes e argumentos.
Fonte: http://www.poemasefrases.com.br/2014/03/eleicao-no-brasil-giano-guimaraes-cordel.html
Voltando para a reflexão interna, o problema do Brasil é sistêmico. Independentemente de partidos, cores, bandeira ou candidatos. O desvio da coisa pública é tão antigo que já não causa espanto do cidadão (o que só favorece a permanência daqueles que estão no poder). Fazendo um recorte temporal, desde a redemocratização brasileira há crise sobre crise e a raiz da mesma é política. A morte de Tancredo foi só o início de um novo velho ciclo que já vinha errado desde os tempos anteriores. Collor, FHC, Lula, Dilma até chegar no Temer: a corrupção é crescente, pois já está incorporada na prática. O problema não é um ou o outro, mas o jogo que é jogado cujas regras são ditadas por quem paga mais ao invés de representar o bem da população.
Assim sendo, afirmo categoricamente que independentemente de quem ocupe o trono presidencial, a sangria de gastos públicos, má gestão e corrupção continuará. A grande diferença é que no governo Dilma houve uma exposição de tais práticas ao mesmo passo em que a mesma perdeu capital político ao não comprar as pessoas certas para se manter no poder e conter a sangria (como fizera FHC, Lula e Temer). Resultado: impeachment (assim como Collor). Mas basta parar e pensar: começou com um Elba e congelamento da poupança de Collor, passou pelas propinas de FHC, houve um abafamento do Mensalão por Lula, as pedaladas da Dilma até chegar ao caso JBS e compra de parlamentares pelo excelentíssimo presidente Michel Rato Temer. Assim o mesmo manteve os privilégios dos amigos políticos e empresários que se sentiam ameaçados com a crescente das denúncias. A justiça pode ser cega, mas não é muda. As delações estão aí para provar.
Sobre as reformas já falei demais sobre o tema neste ano. Basta ressaltar um dado que veio à tona nesse semana: Brasil fecha novembro com 12,3 mil vagas de emprego a menos, indo contra o que fora divulgado pelos defensores da reforma trabalhista. Ou seja, ao invés de aumentar os postos de trabalhos com a perda de direitos ocorreu exatamente o inverso. Mas mesmo assim o governo e os economistas avaliam 2017 como um ano bom. É dinheiro na mala, apartamento repleto de notas, desmatamento acelerado. Realmente, foi um ano bom para os poucos afortunados que compõem a elite brasileira. Se trabalho é sinônimo de dignidade, então o povo brasileiro está perdido.
Fonte: https://ciberia.com.br/dinheiro-achado-em-imovel-que-seria-usado-por-geddel-da-mais-de-r-51-milhoes-24665
A política é feita de seres humanos e por esse motivo os eleitores devem parar de querer achar heróis e vilões. Muitos idolatram o governo FHC; Doria inclusive comentou que o governo de Fernando Henrique Cardoso foi o único descente do Brasil nos tempos recentes. Mas o fato das acusações contra FHC estarem prescritas (devido ao gap temporal que se passou até que as denúncias fossem feitas) não significa que o mesmo seja santo. Basta acessar o site da UOL de hoje e você caro leitor encontrará a seguinte notícia: "Estaleiro diz que subornou Petrobras em R$300 mil durante governo FHC em 2001 e 2002". E depois querem fazer uma seleção de poucos para queimar na fogueira. É necessário ter discernimento para interpretar os fatos e entender o contexto histórico, mesmo nas entrelinhas.
Maluf na cadeia é mais uma prova viva que não existem heróis, pois se fossem outros teriam feito o mesmo. A grande questão é o sistema capitalista consumista vigente. Não podemos aceitar alguém que rouba. Dessa forma lanço as bases para o ano eleitoral de 2018: não precisa ser um profeta, nem o melhor ser humano do mundo; para colocar o país nos trilhos basta fazer o básico, cumprir o que prometer, equilibrar receitas e despesas, punir os desvios, apontar os erros e criar planos de ações para obter êxito. Não precisamos dos mesmos partidos ou de velhos caciques, basta alguém que faça a coisa certa, sem obras faraônicas ou dívidas exorbitantes. Basta fazer o agora pensando no futuro do país e não na reeleição.
A mudança nas regras altera o jogo. Ou seja, somente a mudança no modo de ver e avaliar o Estado e a sociedade é que fará com que a política atinja o objetivo de atender às necessidades essenciais dos cidadãos. Enquanto isso não acontecer, o ano que virá será apenas um reflexo do ano anterior cujo espelho já apresenta trincas e desgaste do tempo. Nem tudo está perdido, mas não há muito o que de fato comemorar. Em todo caso, desejo boas festas e que as coisas realmente melhorem para todos, tanto em pensamento quanto em atos!
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