É da natureza humana, por meio da racionalidade, agrupar e comparar. De um modo mais filosófico, a vida encontra-se em constante dualidade, muitas vezes pautada por oposição. São vários os exemplos que podem ser citados: (a) razão x emoção; (b) vida x morte; (c) esquerda x direita; (d) nacionalismo x internacionalismo; (e) bem x mal; (f) amor x ódio. A vida é feita de escolhas, construída por caminhos diferentes que levam a lugares diversos e que naturalmente se contrapõem no processo decisório, tendo-se em vista a impossibilidade de onipresença e onisciência inerente da humanidade. A problemática encontra-se quando a simples e saudável divergência torna-se extrema.
Hoje tanto o Estado quanto a sociedade brasileira encontram-se em uma situação de "oito ou oitenta". Desse modo, a natural oposição transforma-se em uma rivalidade exacerbada e perigosa cuja cegueira impede o desenvolvimento. O avanço das mídias sociais traz consigo o aspecto da pseudo-sabedoria individual em que cada sujeito pensa ser o dono da verdade absoluta e, associado ao fato da anomia cibernética, perfis são criados justamente para plantar a semente da discórdia e tumultuar um ambiente de desinformação e anonimato. O privilégio da racionalidade é justamente a discussão para criar consensos na construção de uma terceira via que seja o meio-termo para a evolução da espécie. Infelizmente tal diálogo resume-se a acusações acéfalas e violentas.
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/caixa-zero/mudar-de-opiniao-politica/
Sócrates dizia há mais de dois mil anos atrás: "só sei que nada sei". Sábias palavras. Tamanho autoconhecimento sobre a condição humana diante dos mistérios infinitos do universo não se reflete nos dias atuais. Na internet tal reflexão seria: só sei que tudo sei. Esse fator aliado à agressividade presente no gene humano causa confrontos ao invés de debates. Não é rara a constatação de uma falsa notícia fabricada sendo compartilhada aos montes e na parte superior da suposta informação adjetivos como: idiotas, burros, retardados, etc. Santa inteligência humana; afinal, se tempo é dinheiro e as pessoas já não podem parar para pensar diante da correria do dia-a-dia, basta compartilhar uma notícia que lhe convém e resumir em uma palavra o tema. Concisão maior impossível.
Assim caminha a vida social e política do cidadão brasileiro. Reflexo de tempos em que a pressão e a falta de empatia geram confrontos para dar vazão à insatisfação e desilusão das pessoas. O Estado demiurgo brasileiro continua mais forte do que nunca, burguês economicamente e oligárquico politicamente. Enquanto isso os reles mortais continuam batendo cabeça na esfera terciária, sendo manipulados facilmente, sem consolidar uma opinião pública própria, mantendo-se assim uma sociedade desestrutura com grupos organizados espalhados e muitas vezes totalmente opostos.
Fonte: https://www.ibpad.com.br/blog/comunicacao-digital/analise-de-redes-para-compreender-a-polarizacao-politica-do-brasil-no-facebook/
De um lado os coxinhas, do outro lado os mortadelas. Ambos correm em busca do próprio rabo. Basta apontar o dedo, marcar território, manter um posicionamento (mesmo que sem fundamentos) e pronto: estamos mais animais do que a racionalidade pode supor. Um parâmetro para tal constatação é a morte da Marielle: um dia após o assassinato foram tiradas uma série de conclusões e uma troca de acusações sem fim. Espera aí: morreu uma pessoa assassinada, um ser humano, uma vereadora que representava boa parte da população. Morreu uma mulher, uma negra de origem humilde cuja voz ativa incomodava, e muito, alguém de poder. Subitamente a culpa da morte passou a ser da vítima.
O mesmo ocorreu em Sorocaba quando o funcionário de uma multinacional morreu: de um lado estavam os defensores da empresa, do outro os acusadores da mesma. Mas, e a pessoa que morreu? E a família desse pai que faleceu no trabalho? De repente a empresa tomou o espaço central da discussão, suas normas de segurança, certificados, histórico, reputação no mercado. Quem foi mesmo a vítima? Há nitidamente uma inversão de valores e o eterno jogo de empurra de responsabilidades. Muitos sabem (ou fingem saber) dos seus direitos, mas poucos se lembram das próprias obrigações. A alienação e inércia são de grande interesse para a manutenção do status quo.
Fonte: http://portal.ifrn.edu.br/campus/natalzonanorte/noticias/projeto-promove-nesta-quarta-debate-sobre-a-direita-e-a-esquerda-na-politica-nacional
Nesse cenário de fragmentação social é que o Brasil chega para as eleições de outubro. Questões centrais de uma cultura democrática como participação e deliberação foram invertidos para conflito, confronto e intolerância. É a força se impondo, ganha quem falar mais alto em uma competição em que todos tendem a perder. É a discordância calando vozes contrárias. Tal polarização encontra-se inclusive nas principais instituições do país, basta ver o STF em Brasília. De certo modo, o resultado no final do ano é previsível: de um lado bandeiras vermelhas, do outro bandeiras azuis e no meio muita confusão, troca de acusações, tumulto e brigas. É preciso compreender que a imperfeição humana impede uma verdade absoluta e que o unitarismo é contrário à própria natureza da humanidade que se desenvolveu graças à coletividade e espírito de cooperação mútua.
Enquanto a lógica do individualismo, do lucro e do benefício próprio acima de tudo permanecer, o Brasil será o que é. Diálogos são necessários para a construção nacional, programas e propostas diferentes. Entretanto, o extremismo gera polos ativos opostos que se repelem e se enfrentam pelo predomínio da razão e pela conquista do poder. É preciso pesquisar, pensar, conversar e nunca nos esquecermos da fragilidade humana diante dos imponderáveis da natureza. Ou seremos todos juntos, com nossas diferenças que nos une, em prol do desenvolvimento ou continuaremos sendo as ilhas polarizadas da discordância sem críticas construtivas. Por meio do diálogo é possível criar uma terceira via que vai além do "eucentrismo" de ambos os lados. Não precisa todos concordarem em tudo, apenas capacidade de discernimento e respeito.
Anderson, Marielle, Maria, João, Ana, Pedro, Paula, Francisco e tantos outros, presentes em memória, em meio ao caos brasileiro!
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