segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Reflexão sobre uma nova janela para o futuro

Portas trancadas
Cortinas fechadas
Janelas quebradas
Muros nas fronteiras
Cadeados no portão
Pontes caídas
Cortes
Contingenciamentos
Gastos
Onde estão os investimentos?
Uma promessa
Palavras ao vento
Sobram argumentos
Falta solidariedade
Pois que o lema contemporâneo seja
Assim como no passado
O mesmo lema ainda atual
Conectados em redes humanas
E não estruturadas no ódio fatal
Liberdade, igualdade e fraternidade!
Simples como deveria ser
Unidos pela empatia que não aceita
O racismo, o descaso, a falta de compaixão
Criminosos criminando uma nova má gestão
Os direitos perdidos
Os trabalhadores vencidos
Um nó na garganta
Muito além do nó na gravata
Os navios negreiros atracados na contemporaneidade
Neocolonialismo
Neoliberalismo
Neoescravidão
Ainda há tempo para a revolução
Liberdade, igualdade e fraternidade!
Sem perder as raízes
Sem esquecer as crises
Em busca da dignidade
O que é ser feliz?
O crescimento do PIB e da economia?
Estagnação na evolução
Retrocesso humanitário
Um gato de rua ou um carro de luxo?
Um dilema
Uma dualidade
Uma dicotomia
Um ser que é sempre será mais do que ter
Qualidade de vida
Sem distinção entre as pessoas
Adversários, não inimigos
Organizando a resistência popular
Sem ódio, sem rancor
Assim como Jesus
Denunciando injustiças e tiranos
Ao lado de quem precisa
Pobres por fora, ricos por dentro
A roda gira em um ciclo que parece interminável
Uma ruptura
Um elo
Vida que segue
Reflexão sobre uma nova janela para o futuro


Porta destrancada
Cortina dançante
Janela entreaberta
Muros no chão
Grades sem cadeados
Pontes construídas
Integração
Internacionalização
Vizinhos fraternos
Saúde e educação
Se colocar no lugar
Alianças que renovam
Pensar
Dialogar
Respirar
Amar
Uma mão amiga estendida
Um ombro, um colo
Lágrimas de saudade, não de dor
Mesa farta sem exploração
Um porto livre, sem correntes
Uma foto, uma lembrança
Menos virtual, mais real
Um beijo, um abraço
Sem medos, sem insultos
Apenas felicidade
Liberdade, igualdade e fraternidade!
Um carinho nos bichinhos
Um lema antigo
Tão atual em seu sentido
Novas oportunidades
Equidade
Vista, passagem
Espaço, paisagem
Liberdade, igualdade e fraternidade!
Uma janela aberta para um novo mundo
Uma janela aberta para cada porta fechada
Uma janela aberta para um novo dia
Uma janela aberta para o futuro!

terça-feira, 26 de novembro de 2019

Reflexão sobre a marcha dos porcos

Marchem!
Foi dada a largada
Enfileirados na promoção
Esperando a abertura do portão
Rastejando na lama
Com a camisa da seleção
Marchando em direção à liquidação
Ocupando as ruas contra a corrupção
Mas elegendo um laranjal sem fim
Despotismo e nepotismo lado-a-lado
Quem vai pagar o pato com a terceirização?
Mais uma realidade dessa louca contradição
Panelas silenciadas que não entram mais em ação
Imperdível!
Beijando os pés do patrão
O medo é mais forte do que a razão
Marchem para a nova plástica
Rumo à perfeição inatingível
Precarização das condições de trabalho
Parasitas do sistema
Defendendo o retorno da ditadura
Idolatrando torturadores e assassinos
Depois se diz cristão
Pare de usar a religião
O velho discurso demagogo
Repleto de segundas intenções
Mais uma enganação pública
A população está cansada de pagar a conta


Marchem porcos!
Uma nova taxa para o seguro-desemprego
Sugando e sendo sugados
O lucro bancário só aumenta
A terra há de consumir os vestígios
Não existe crime perfeito
Apenas milicianos conhecidos
Vendendo o corpo pelo novo conforto
Coleira apertada
Presentes sem necessidade
Acúmulo de bens materiais
Tudo se vende, tudo se troca, tudo se aluga
Comprando animais ao invés de adotar
Esconda seus desejos sórdidos
Um novo Coringa a cada esquina
Um novo bebê a cada dia
O sistema não para, não pode parar nunca
Céu cinza do desmatamento e da poluição
Nada mais normal do que o contágio pelo superávit
O capital não pode estagnar
Deflação é crise, o choro é livre
Funcionário do mês sem casa para morar
Alternância das elites para manter o status quo
Assento VIP na primeira fileira
Minoria que domina
Casa na praia, iates, a classe média faz a sua parte
Nada como se sentir bem com a desgraça alheia

Marchem porcos imundos!
Os joelhos já não aguentam andar pela loja
Terapia das compras, vida de madame
Deixe a sujeira para as domésticas e operários
Submissão assalariada pela sobrevivência
Veja no Ibope o que dá mais audiência
Peregrinação a paraísos fiscais
A via-sacra do capital foi anunciada na televisão
Propagandas e produtos dos patrocinadores
Melancolia, tristeza e depressão
A intolerância sendo tolerada
Não me peça para aceitar
Depois não venha reclamar
Devolução em apenas três dias úteis
É preciso estar conectado
Um teatro de ostentação
Nova foto de perfil
Rede social da ilusão
Lutando contra fantasmas
A ganância fala mais alto
Justiça cega pelo poder
E assim se acumulam golpes no chiqueiro
Sob símbolos nacionalistas de exclusão
Até chegar à exaustão
Julgam vítimas e matam inocentes
O mundo do business é o modelo de negociação
Mercantilização dos raios solares
Monitoramento 24h
Tudo para a sua segurança
A vigilância sem privacidade
Quem se importa?
Sem tempo para participar
A morte espera

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Marchem!
Descartando o próximo como se fosse lixo
É possível sentir o seu cheiro podre embrulhado para presente
É possível ver o seu desespero conservador
Querendo controlar um mundo que não lhe pertence
A hipocrisia é a alma do negócio
Agindo de acordo com a lei de mercado
Concentração de riqueza nas mãos de poucos
Qualidade de vida em detrimento da escravidão alheia
Vidas desperdiçadas na fauna e na flora
Nada disso importa segundo a lógica do dinheiro
É preciso satisfazer o prazer nas horas vagas
Afinal, a bolsa de valores bateu mais um recorde
Quais valores?
Um novo corte nos pulsos
A padronização dos estigmas em meio ao processo de globalização
Matando para vender
Queimando para lucrar

Marchem seus porcos imundos!
Dançando a ópera do dilúvio
O apocalipse nunca esteve tão próximo
O inferno estará repleto de mansões e carros de luxo
A satisfação nunca é atingida pelo consumo
Você precisa de mais, mais, mais
Você viu o novo comercial?
Falso messias no assento presidencial
Rasteje de joelhos na lama
Assuma a sujeira que está fazendo
Sangue nas mãos e ódio no coração
Salve a própria enganação
Cuspindo no prato que comeu
Vômito voluntário de desprezo
Eles estão desesperados
Eles estão sem controle

Marchem seus porcos!
O natal está chegando
A mesa da ceia deve estar farta, obesa
Consumindo a própria carne
Atirando pedras na imagem que surge no espelho
Um novo produto na vitrine
Uma nova corrida pela sobrevivência
Carro novo na garagem
Fotos em Orlando e Paris
Passaporte cheio, alma vazia
Amizades de interesse em busca de holofotes
Fingindo não ver a revoltar popular
Fingindo não ver as barreiras humanas
Siga o fluxo migratório
Uma nova guerra pela hegemonia mundial
Pois é necessário que alguém perca para outro ganhar
Celular última geração com peças roubadas
Células artificiais de uma engrenagem enferrujada
Camisa de marca falsificada
Trabalho infantil e escravo nas fábricas
Realidade invisível do terceiro mundo


Marchem porcos, marchem!
Sigam a fila para o precipício
O chiqueiro está cheio, assim como o hospício
Um sorriso antes da desilusão
É tudo briga por posição
Dê espaço aos ratos e baratas dos esgotos
Hasteie a própria bandeira
Um demônio dentro do cidadão de bem
Imagine todos armados até os dentes
Eu sou a cárie sem cura
Feridas deixam marcas difíceis de cicatrizar
Olhe só para os últimos 500 anos
Esquecendo da própria identidade
Compre seu lugar no céu
Viagem de primeira classe
Todos iguais
Feitos de ossos, não de metais
Todos iguais
Do começo ao final

Marchem!
Marchem porcos consumistas!
Nas trincheiras esquecidas
Nas fileiras dos soldados de shopping
Subindo as escadas rolantes
O capitão continua atrás da mesa
Fugindo de debates, fomentando a polarização
O discurso de ódio também tem um alto custo
Datas promocionais e feriados festivos
A praia já está cheia e o trânsito também
Sem espaço, sem tempo irmão
Qual o significado disso tudo mesmo?
Prazer individual e imediatista
Coloque grades em seu feudo para fugir da violência
Está um caos lá fora
Arame farpado, telas, construa o seu império de fantasias
Cerque sua propriedade privada
A especulação imobiliária não irá permitir sua procriação
Vamos celebrar a inveja e a nova inquisição
Inversão de valores onde tudo tem precificação
Neoliberalismo das crises e dos retrocessos

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Marchem porcos!
Engravatados, sujando os ternos
O sapato que não cabe mais
Vista o uniforme desbotado do preconceito
Seu ego insaciável e faminto
O fuzil continua a disparar
Vamos seus porcos imundos!
Uma última tragada, um último suspiro
O copo está meio cheio ou meio vazio?
Marchem com suas etiquetas de grife
Antes que o estoque acabe
Demanda e oferta, quem dá mais?
O enterro é o desfecho em comum
Sete palmos abaixo da terra
Isso não precisa fazer sentido
No final das contas pouco importa
Débito ou crédito?
Rumo ao abismo da desigualdade que os espera.

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Reflexão sobre o tempo e o espaço

A cada dia que passa nasce uma nova história, nasce uma nova geografia que é construída em um processo que ultrapassa o próprio indivíduo. Tão natural como a respiração e os sistemas presentes nos processos biológicos, tão comum como a linguagem diária no processo comunicacional entre os seres vivos. O tempo e o espaço formam a origem de tudo o que existiu, o que existe e o que ainda irá existir, reforçando assim a legitimidade das disciplinas de geografia e história para o conhecimento humano.

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Dentre as teorias que buscam a compreensão sobre o cerne da origem é possível destacar duas: (a) a teoria criacionista baseada em um conceito teológico pautado, sobretudo, na fé, exigindo assim um alto grau de abstração; (b) a teoria evolucionista tida como um paradigma científico desde a sua proposição por Charles Darwin no século XIX. Mesmo diferentes entre si, existe a possibilidade de integração entre ambas, tendo-se em vista que a origem científica mais consolidada e difundida atualmente parte do princípio por meio do Big Bang, havendo uma brecha que pode ser preenchida pelo complemento teológico para o momento anterior ao da grande explosão. Seja como for, a importância do tempo e do espaço é inegável.

Focando a análise na teoria da evolução (não somente das espécies, mas do próprio universo em si) é possível afirmar que a relatividade impera no processo de expansão dos cosmos que evolui de formas e em tempos diferentes ao longo de bilhões de anos. Se tudo o que se tem hoje originou-se dessa energia expandida, então é correto afirmar que a concreticidade deriva-se do tempo e espaço. Por esse motivo não seria exagero afirmar que as disciplinas de história e de geografia são as pedras fundamentais para o entendimento holístico das demais.

Relação Espaço-Tempo

Não existiria engenharia, administração, arquitetura, psicologia, biologia ou qualquer outra matéria sem que houvesse um tempo e um espaço. Como calcular a velocidade e a aceleração de um veículo sem especificar a distância percorrida? De onde para onde? Quando? A fragmentação do todo em partes para melhor análise já era defendido por Descartes e tal abstração teórica é essencial para os estudos. Entretanto, segregar o teórico transportando-o para a realidade indica reducionismo. Mesmo a própria humanidade possui em si as marcas das relações temporais e espaciais, sendo uma derivação destas. Assim sendo, o tempo e o espaço não são subjetivos, pois a subjetividade refere-se à percepção do sujeito e ambos antecedem qualquer forma. 

Ora, se espaço e tempo constituem a origem da matéria, então é possível sentir, observar, tocar. Logo, sua concreticidade se faz presente em cada elemento oriundo dos mesmos. São os cabelos que embranquecem, as rugas que aparecem, são as edificações que se tornam vulneráveis às intemperes, são as paisagens, as sazonalidades da natureza, são as construções deterioradas, é a localização do aplicativo de transporte. Existem diferentes modos de contar o tempo, diferentes calendários, do mesmo modo que existem diferentes modelos métricos. É relativo, assim como diferentes lentes para enxergar um determinado espaço. O ponto cego não justifica a subjetividade do sujeito e não pode contaminar o que ultrapassa o próprio ser.

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Logicamente que cada pessoa possui dentro de si uma percepção do movimento do tempo e do espaço, mas essa subjetividade do indivíduo não significa que o tempo e o espaço também são subjetivos, pois estes vão muito além. Não é produtivo iniciar um estudo sobre anacronismo, diacronia, sincronia, fluxos ou dinâmicas espaciais sem refletir sobre o que antecede. As rugosidades geográficas e históricas estão aí para provar e ultrapassam a superficialidade do argumento subjetivo.

Tal debate é importante para o entendimento das relações universais, assim como o próprio Einstein classificara em sua Teoria da Relatividade durante o século XX. A própria epistemologia deve refletir e se aprofundar sobre o tema. Abdicar de tal debate em uma disciplina de cunho filosófico tão fundamental para qualquer matéria é negar as próprias origens, é se abrigar dentro das próprias certezas e se abstrair de questionamentos. A própria ciência é dinâmica, feita de movimentos e que podem gerar um novo entendimento criando assim um novo paradigma. Mesmo assim, tanto as pessoas quanto as teorias oriundas destes ainda precisarão de um tempo e um espaço para existirem.

sábado, 2 de novembro de 2019

Reflexão sobre a fragmentação do PSL

Fundado em 1994 pelo empresário pernambucano Luciano Bivar (hoje presidente do partido), o PSL (Partido Social Liberal) passou de nanico desconhecido para partido do atual presidente. Registrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em 1998, nunca tal instituição usufruiu de tanta notoriedade como agora. Em menos de um ano após a obtenção do poder e de destaque midiático, o partido atualmente oscila entre a expansão possível no horizonte próximo das eleições municipais de 2020 e a fragmentação interna motivada pelas principais figuras que compõem o seu quadro.

Partindo de uma escalada meteórica no pleito eleitoral passado, são vários os fatores que ajudam a entender o fenômeno que elegeu a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados por meio das eleições de 2018 e que hoje encontra-se em crise. Aproveitando-se da onda de insatisfação popular contra o establishment político brasileiro explicitado de forma não equitativa pela operação Lava Jato e da perda de legitimidade dos partidos tradicionais, o PSL dominou as manchetes do mundo inteiro com a polarização que travou com o Partido dos Trabalhadores e que culminou na obtenção da cadeira presidencial por Jair Bolsonaro. 


Ademais, elegeu deputados, senadores e governadores alinhados com os princípios de sua figura central, perdendo parte de sua autonomia para a família do presidente. Sob a bandeira do neoliberalismo estrangeiro com vistas às privatizações e intervenção mínima do Estado em questões sociais e econômicas, o PSL simplesmente esqueceu do S que compõe o seu nome, mas continua sendo um liberal partido, rachado e com práticas de rachadinhas, embolsando parte dos salários dos assessores. Assim sendo, o partido demonstrou que também é contra os trabalhadores brasileiros, tirando até mesmo dos seus funcionários. 

Aproveitando-se do medo e do ódio nacional que cobriu o Brasil devido, sobretudo, ao desemprego crescente e a proliferação da violência como um câncer que afeta o tecido social, o partido fez história em uma campanha caracterizada por discursos autoritários, pautas conservadoras nos costumes e fake news. Com um grande número de apoiadores no espaço cibernético, não há dúvidas que a ferramenta que impulsionou o PSL foi a internet e suas redes sociais, seguindo os passos de Trump e surpreendendo devido ao seu poder de alcance, mesmo com uma pauta claramente contrária aos direitos humanos. O que será de uma sociedade que esquece da sua essência e vai contra os próprios princípios da humanidade? O que será de um partido que esquece parte do próprio nome e, consequentemente, perde espaço para um clã que mais parece uma quadrilha?

Da fragmentação nacional durante o período do escrutínio para a fragmentação interna. O que se nota é uma verdadeira implosão do partido causado pelos principais políticos da própria legenda. O auge dessa disputa interna está entre a ala bolsonarista, fiéis seguidores incondicionais, versus a ala bivarista que defende os interesses da sigla em detrimento dos interesses privados da família Bolsonaro. Um verdadeiro programa de baixarias envolvendo casos de família, onde o patrimonialismo se confunde com o público e repete o passado coronelista do Brasil. Nada de novo na pátria de poucos.

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Crises dos partidos políticos não são novidades e podem ser caracterizadas da seguinte forma: (a) competição - tanto entre as legendas, como também disputa interna pelo poder e influência; (b) ideologia - mudanças nos valores da sociedade; (c) volatilidade - maior movimentação e agitação dos partidos no processo competitivo inerente ao sistema, tornando-se mais acessíveis e surgindo novos partidos como alternativa ao declínio de partidos tradicionais, acirrando assim a disputa.

O cenário pluripartidário da política brasileira fez com o que o PSL passasse despercebido por duas décadas. Agora, com os holofotes sobre o partido, o que se vê é uma troca de acusações, ameaças, insultos e insatisfação dos próprios membros que integram o mesmo e que não se entendem entre si, tornando as brigas públicas. O fato é que não são poucas as denúncias que envolvem o PSL e alguns de seus membros. Pessoas que fizeram ou que ainda fazem parte do governo como Joice Hasselmann, Alexandre Frota, Delegado Waldir e o próprio Jair Bolsonaro acusam o partido e uns aos outros em um jogo de faroeste em que todos atiram contra todos. 

Sem dúvidas, o partido perdeu espaço e se tornou menor do que a figura dos Bolsonaros. O divórcio entre ambas as partes não parece distante e se realmente acontecer será uma separação prematura. A percepção que se tem é que o PSL precisa mais do presidente do que o presidente do PSL, o que desloca o partido para um quadro secundário cuja própria instituição se apequenou diante da sua figura central, semelhante ao que aconteceu com Collor e PRN. É fácil criticar enquanto se está na oposição; entretanto, estando o partido no poder, é necessário deixar de lado promessas falaciosas e agir para o bem de todos, não somente para um grupinho seleto de apoiadores.

PSL

É um laranjal sem fim que atinge tanto a cúpula do partido como os filhos do presidente. É a velha paranoia bolsominion que parece um tiozão chato de churrasco falando sobre ameaças de um passado inexistente, são os funcionários fantasmas sem explicação, é o governo que diz que se espelha no "caso de sucesso" da reforma chilena sendo um exemplo para o modelo brasileiro e que agora teme que os mesmos protestos do Chile aconteçam no Brasil utilizando-se de um discurso ditatorial e saudosista em torno do AI-5.

É a indicação nepotista de parentes para cargos públicos sem o mínimo de preparo, é o ministro que agiu sem ética e sem imparcialidade enquanto juiz inclusive dizendo que nunca entraria para a política e que hoje depende do presidente. É o guru que mora nos EUA e cria uma disputa interna desnecessária entre a ala militar e a ala olavista. É o Chicago Boy (guru da economia) que só sabe falar em cortes e gastos, mas nunca em investimento. É o vexame na ONU e o amor não correspondido pelo ídolo Trump, quase uma paixão platônica. É a suspeita de ligação com milicianos, é a falta de diplomacia para com os vizinhos, é a falta de noção e de um panelaço de bom senso. 

Falta de decoro e decomposição de um falso herói que se mostrou não ser mito algum e que nem precisa de oposição para atrapalhar o próprio mandato. É o aval implícito contra o meio ambiente, é o ministro suspeito de corrupção, é a submissão e entreguismo aos países considerados "amigos", é a culpa sempre dos outros, é o desuso do Estado laico. É o despreparo político e desrespeito para com a maioria que não votou em um governo sem planejamento que parece ainda estar em campanha fazendo um desfavor ao país ao invés de uni-lo. 

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Reflexão sobre partidos políticos

Como o próprio nome já diz, partidos políticos representam partes da sociedade, grupos que se juntam conforme afinidades políticas. Longe de ser um consenso, a definição sobre o tema varia conforme os diferentes pensadores. Mesmo assim é necessário compreender do que se trata, tendo-se em vista que os partidos políticos estão entre as figuras centrais das instituições que compõem o Estado contemporâneo por meio da democracia participativa indireta desde a expansão do sufrágio universal em meados do século XIX. 

De forma compacta e genérica, partidos políticos são grupos organizados que buscam o controle do poder por meio das eleições, visando assumir o governo. São pessoas jurídicas de direito privado fundamentais para o funcionamento da democracia representativa que vigora em boa parte do planeta na atualidade. O sucesso eleitoral conforme descrição acima é um tanto quanto reducionista, pois pode excluir partidos antissistema e países de regime de partido único cujo intuito principal de tal legendas não é obter êxito nas eleições. Portanto, tal definição serve apenas de base para a construção do raciocínio sobre a temática.

Órgãos provisórios Partidos Políticos

É possível apontar duas diferentes características sobre a origem de um partido político: (a) interna - são os partidos formados pela união de grupos parlamentares; ou seja, formado por pessoas de dentro do jogo político que já integram o sistema; (b) externa - são os partidos formados por grupos de fora do parlamento como, por exemplo, movimentos sociais e sindicatos. Este último tipo possui uma maior centralização no que concerne a sua organização e também uma maior identificação entre seus membros, possuindo um contato interpessoal mais amplo.

Partindo de uma visão ampla, é possível afirmar que os partidos políticos fazem o meio de campo entre a sociedade civil e o Estado, sendo assim uma ferramenta institucional de ligação regularizada pelo próprio sistema - o que de certa forma inibe a formalização de agrupamentos políticos radicais contrários ao sistema. Afinal, a manutenção das regras pertence ao grupo dominante que está no poder e, desse modo, não é interessante fomentar grupos cujo objetivo central é a ruptura do status quo.

Partidos políticos: ¿De dónde proviene el dinero para sus campañas electorales? - dreamstime.

Utilizando-se dos critérios para diferenciação dos partidos políticos segundo o cientista político LaPalombara, referencial este colhido durante a graduação, é possível apontar quatro tópicos: (1) organização durável: continuidade da organização ao longo do tempo (historicidade da instituição partidária); (2) organização completa: existência de uma organização formal nacional e local, de modo que não sejam apenas agrupamentos parlamentares; (3) vontade de exercer o poder: seja sozinho, seja por meio de alianças ou coligações; (4) busca do apoio popular: filiação de membros e busca por eleitores.

Existem outras formas de classificar e categorizar as legendas como analisar a estrutura organizacional (desenho hierárquico), meios de obtenção para financiamento, posicionamento ideológico, modo de relacionamento com os próprios membros e com a sociedade, entre outros. Desse modo, é possível rotular os "catálogos de famílias partidárias" conforme os seus alinhamentos e visão de mundo como liberais, operários, religiosos, etc. Fica claro aqui que os partidos políticos são partes que representam as clivagens sociais existentes.

TRE-GO Filiação Partidária

Sobre os tipos canônicos, os principais são: (a) partido de quadro - segundo Maurice Duverger, possui poucos membros, mas contribuem diretamente, seja por meio de contribuições financeiras, seja por meio de atividades no partido; (b) partido de massa - ampla organização extraparlamentar atuante não somente no período eleitoral, mas de forma permanente no recrutamento de membros e nas demais atividades. Além disso, esse modelo argumenta que as legendas têm forte ideologia, representando segmentos sociais específicos; (c) partido catch-all - surge devido ao sucesso dos partidos de massa. Entre os principais fatores para o seu surgimento, Otto Kirchheimer aponta para a desideologização do discurso, fortalecimento da figura da liderança, declínio da militância de base e abertura de interesses variados; (d) partido cartel - modelo da relação e dependência entre partido e Estado por meio de subsídios públicos, constitucionalização, acesso a bens públicos, reconhecimento e formalização do partido, criação de leis específicas, entre outros.

É possível concluir que a dinâmica atual do sistema democrático representativo está ligada diretamente aos partidos políticos. Estes são a ligação entre os anseios populares da sociedade civil e a representação de seus eleitos dentro do aparato estatal. A manutenção do sistema político atual depende da organização e da atuação dos partidos, quer goste ou não. 

Mesmo que tal modelo seja utilizado por vezes para aspectos positivos para a construção social, por vezes para aspectos negativos visando interesses particulares, não há como realizar uma democracia indireta com sistema político e eleitoral sem a participação de partidos. Formas alternativas como a participação direta ou mesmo ausência de um poder estatal central são consideradas antissistema e classificadas hoje em dia como utópicas (apesar de possíveis) por pregarem a ruptura com o sistema vigente.

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Reflexão sobre a deflação demográfica e a geografia do capital

O crescimento populacional foi exponencial em todos os continentes, passando de 600 milhões em 1700 para 7 bilhões em 2012, estimulado sobretudo pela Ásia onde atualmente é possível apontar como exemplo o caso da China, país mais populoso do mundo com quase 1 bilhão e 400 milhões de habitantes, seguida de perto pela Índia que também já superou a marca de 1 bilhão de pessoas conforme apontado por Thomas Piketty no livro O Capital do Século XXI (p.80, 2014).

Entretanto, tal fenômeno de superpopulação não se configura uma tendência mundial para os cenários dos próximos séculos. Estudar a dinâmica demográfica é fundamental para analisar a evolução da população e estimar o seu futuro com base em indicadores e taxas. Malthus (economista inglês) teorizou em 1798 que a capacidade produtiva de alimentos cresceria em progressão aritmética enquanto que a população cresceria em progressão geométrica, iniciando uma abordagem ampla para discussão sobre elementos geográficos e econômicos.


O Brasil recentemente ultrapassou a marca de 210 milhões de habitantes. Segundo projeções da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre a população brasileira, estima-se que entre 2030 e 2035 o país atingirá o seu ápice populacional com 218 milhões de habitantes e depois passará por um processo de queda demográfica que pode representar cerca de 113 bilhões já em 2100. Tal declínio se assemelha com o que é previsto para outros países neste novo milênio. A deflação demográfica já é uma realidade em estágio inicial no Japão e em alguns países da Europa Ocidental.

O sistema capitalista necessita de crescimento, seus genes contêm cromossomos de superávit diários. Lutar contra isso seria contrariar a sua própria composição. O aumento da produtividade e do consumo costumam ser as respostas do capital para sair das crises que o assola. O não crescimento significa recessão, incertezas, prejuízos, perdas. Estagnar ou declinar não faz parte dos planos de nenhum manual capitalista rumo ao sucesso. O lucro é a alma do negócio e sem alma não há vida.

Muito além da mais-valia, da tecnicidade, dos objetos, mercadorias, signos ou das relações de produção. Trata-se do equilíbrio da tríade da sociedade capitalista reforçada como ponto fixo de análise por Henri Lefebvre (p.11, 1973): a intersecção entre Terra, trabalho e capital. A demografia estará inevitavelmente no centro da discussão, seja sobre a reinvenção sistêmica do capitalismo ou na mais nova crise que o traz à beira do abismo.


O que seria da classe média na contemporaneidade se não um istmo? Estreita passagem que une dois continentes diferentes. Pressionada por ambos os lados, uma classe média sujeita a movimentos tectônicos e inundações capazes de alterar a sua configuração. Híbrida entre o céu e o inferno, a classe média é abastecida pelos interesses da burguesia. É a cordilheira perfeita para a proteção das elites, a desinformação que mantém as diferenças e consolida a desigualdade. Apenas o meio ambíguo, duplicidade de ideias e ações entre a dúvida plena e a convicção cega, não uma alternativa para sair do conflito, não uma terceira via factível. Meio sem ser ambiente, não sustentável, em cima do muro. O que será do meio com a diminuição populacional a longo prazo?

Não se pode subestimar a capacidade do capitalismo em se reinventar, mesmo quando o assunto é deflação demográfica. A cada avanço tecnológico o mesmo torna-se mais forte, cria dependência, aliena as pessoas. O determinismo social e psicológico deve ser levado em consideração. Mesmo sem resolver problemas como a pobreza, miséria, desigualdade social, má distribuição de renda, entre outros, o capital conseguiu, ao longo dos séculos, atenuar seus defeitos (mesmo que midiaticamente) e derrubar oposições.

Países como Bélgica, Suíça e Canadá já possuem incentivos para atrair indivíduos para o seu território. A tendência de queda na taxa de fecundidade está levando também à uma redução considerável da taxa de natalidade, sobretudo nos países tidos como desenvolvidos. A inserção das mulheres no mercado de trabalho, avanços tecnológicos nos métodos contraceptivos, mudanças de comportamento e a redução dos espaços de habitação nos grandes centros urbanos levaram as famílias à opção de terem menos filhos.


Se não houver o deslocamento de pessoas de regiões mais populosas para outras regiões com baixa taxa de fecundidade e de natalidade, a consequência será o envelhecimento da população e seu posterior encolhimento. Tal distribuição populacional será vital para a organização futura das nações. O ajuste demográfico passa a ser assunto central das políticas públicas.

O capitalismo precisa da cidade, precisa da urbanização, precisa de uma reserva de trabalhadores, da gentrificação, da especulação imobiliária, da conurbação urbana, da superpopulação. O capital precisa de pessoas, operários, técnicos, gerentes, precisa da natureza e do mercado, precisa modificar o meio ambiente, precisa mudar hábitos, precisa criar dependência, precisa de mais recursos, de novas máquinas, de mais consumo. O capital precisa se expandir, crescer para todos os lados nos mais diversos âmbitos.

Do mesmo modo que o crescimento exacerbado da população representou um fantasma e ainda assusta o mundo diante da escassez dos recursos naturais e da limitação da oferta diante da alta demanda, o inverso também se faz verdadeiro. Se com um boom demográfico houve uma explosão das cidades, o oposto significa um aumento na barganha e na capacidade de escolha dos cidadãos. A redução no consumo e a subutilização da estrutura urbana já edificada representam um risco para a manutenção do capital.

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Reflexão sobre a dialética

É consenso para todos os seres racionais que o diálogo é a melhor alternativa para a solução de problemas. Mesmo em tempos em que a violência e as armas estão em voga, uma boa conversa ainda é uma opção para o dia-a-dia. Não se trata de uma novidade: desde os tempos da Grécia Antiga é possível observar a relevância da dialética para um caminho pautado no esclarecimento construtivo.

Há cerca de quatro séculos antes do nascimento de Cristo, Sócrates já andava pelas ruas atenienses proliferando a afirmação de que tudo que sabia era que nada sabia e a partir deste ponto de abstração e modéstia confrontava os ditos intelectuais gregos da época com questionamentos sobre suas certezas que, geralmente, no final das contas, não se travam de verdades tão convictas assim. Com uma certa dose de ironia diante dos sofistas, o filósofo utilizava o método dialético para a reflexão como um verdadeiro parto que dava luz à novas ideais.


Mais importante do que respostas é saber fazer as perguntas certas. A proporção de tal relevância pautada na dúvida e no questionamento é sentida até os dias atuais no âmbito acadêmico. Muito além do que simplesmente ter uma suposta razão efêmera, a dialética trata-se de um grande diálogo construtivo em busca de novos caminhos. O objetivo é aperfeiçoar o entendimento sobre determinado assunto de modo profundo, ultrapassando as barreiras da superficialidade.

No século XVIII, mais de mil anos depois da dialética socrática e após várias interpretações de seus respectivos discípulos (Platão e Aristóteles) e demais seguidores, o método ganhou novos contornos por meio da visão hegeliana. Hegel apontava para a característica de movimento em que cada ideia parte de si para uma segunda, gerando assim, consequentemente, uma terceira formulação, fruto da construção das duas primeiras formulações. 

Tal dinâmica pode ser representara pelo seguinte fluxo: tese - antítese - síntese. O método dialético baseia-se, segundo Hegel, na afirmação contraposta pela negação o que gera a negação da negação. A crítica inerente ao processo dialético rompe com o dualismo ao formar tríades. O resultado de cada método dialético origina uma terceira via, um novo paradigma pautado na relação mútua entre objeto e sujeito, sem priorizar um dos lados. Superação da lógica.


No século seguinte (XIX), Engels e Marx consolidaram o termo ao influenciar gerações e a ciência em seu âmbito mais formal por meio de dissertações, teses e teorias. Marx afirmava que a dialética é, simultaneamente, pensamento e realidade. Desse modo, o marxismo ressalta o aspecto da crítica, da historicidade e do materialismo no método dialético revisando Hegel. Este método consagrou-se nos trabalhos acadêmicos na contemporaneidade, sobretudo nas áreas de Humanas. 

Partindo da racionalidade humana, o diálogo de pensamentos é utilizado mesmo na formulação de projetos físicos. Ora, se o processo dialético é pautado no movimento do saber do indivíduo, cada novo paradigma é resultado desse embate de ideias, alterando o que antes era certo e sólido, muitas vezes pautado em avanços tecnológicos. A comunicação é própria da dinâmica humana, não adianta fugir das próprias origens e dos debates.

Isso não quer dizer que o método hipotético-dedutivo (cujo foco é dado ao objeto de modo analítico) e o método fenomenológico-hermenêutico (cujo foco está na percepção do sujeito) estão descartados. Inclusive, é possível conciliar os métodos em diferentes fases de uma pesquisa (apesar de tal prática não ser muito recomendada por professores e orientadores na elaboração de um projeto científico). O grande diferencial da dialética é que o diálogo está em constante deslocamento, migrante, talvez até nômade, agregando conhecimentos, questionando, propondo novos caminhos sem nunca ficar estático. O próprio processo de criação de paradigmas é feito de ruptura e movimento.

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Reflexão sobre a banalização dos direitos humanos

O conceito de direitos humanos aparenta sofrer uma deterioração com o tempo em diferentes lugares do planeta. No âmbito global a própria ONU (Organização das Nações Unidas) perdeu sua relevância internacional como mediadora de conflitos e crises em defesa da proteção dos indivíduos. O que era dado como consenso mundial durante a criação da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 após a Segunda Guerra Mundial (cujo saldo foi mais de 60 milhões de mortos e tantas outras violações à condição humana tais como fome, tortura, trabalho forçado, estupros, agressões físicas e psicológicas, etc.) parece ter se perdido. Será meramente uma questão psicológica de memória curta? A questão aqui é tentar entender o motivo de tal descrédito.

Uma das possíveis causas que compõem a conjuntura da perda de parte da legitimidade dos direitos humanos é justamente o seu alto teor teórico. Tendo como ponto de partida a inspiração oriunda tanto da Declaração de Direitos de Virgínia (1776) associada à independência estadunidense, quanto da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) associada à revolução francesa, o que se nota é uma contradição histórica típica do capital. Em ambos os casos, as declarações ficaram mais na esfera do direito do que no âmbito da prática, não sendo válidas de um modo abrangente. Ou seja, não se aplicavam para grande parte da população.


Nos EUA, os direitos ficaram restritos a uma parcela dos cidadãos. Assim como ocorreu no nascimento dos conceitos de cidadão e de democracia na pólis grega, boa parte da população ficou às margens dos direitos proclamados. A questão da participação e do papel das mulheres e das crianças na sociedade só seria tratada com seriedade e equidade ao longo do século XX. A escravidão continuou forte como parte fundamental da economia dos estados sulistas, fato que se estendeu até a guerra civil estadunidense e ainda hoje deixa marcas.

Na França o que se notou após a libertação popular do absolutismo monárquico foi um período de encontros e desencontros, causando instabilidade e em alguns momentos até mesmo uma desordem entre os franceses nos períodos após a queda da Bastilha, o que só foi contornado com a ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder. As ideias eram boas e inspiradoras com o lema de igualdade, liberdade e fraternidade, mas, de fato, não houve coesão social capaz de manter o equilíbrio diante da anomia.


Entretanto, uma tentativa de explicação pautada apenas na temporalidade e na espacialidade não é suficiente para entender o motivo da banalização dos direitos humanos atualmente. No Brasil, especificamente, existe uma tradição antiga, o chamado jeitinho brasileiro, que tem por costume rotular as leis em dois grandes grupos: (a) as leis que pegam: em que há fiscalização e conscientização do cidadão no cumprimento das mesmas; (b) as leis que não pegam: mera formalização textual que, por vezes, é negligenciada pelo poder público, privado e pelo indivíduo. Portanto, nem sempre o que é de direito é de fato.

É possível apontar também as desigualdades sociais no arcabouço de tamanho enraizamento de desprezo para com os direitos da própria espécie, direitos humanos que pertencem à natureza de cada um. Essa desigualdade se dá pelos privilégios que o sistema oferece para alguns poucos em detrimento de tantos outros. O raciocínio é simples: se o cidadão mediano necessita acordar cedo, pegar trânsito, trabalhar, estudar e pagar as suas contas, por qual motivo certas pessoas, mesmo sem precisarem de fato, possuem, por direito adquirido, auxílios especiais para moradia, terno, gravata, carros oficiais, motoristas particulares, ajuda de custo em viagens, vantagens de cargo, bolsas sem trabalhar ou produzir, entre outros exemplos que causam na maioria da população um estado de apatia ou de ira? 

 

A relatividade da lei e a sua diferenciação deve ser levada em conta nesta análise de causa-raiz, pois se estamos falando de direito, devemos entender suas características fundamentais e gerais para uma análise holística. A falta de credibilidade jurídica e política impactam na queda de legitimidade dos direitos humanos. Efeito de causa e consequência. Se alguns possuem foros especiais e se a mesma lei não se aplica a todos, a justiça tem a sua parcela de participação. Nem sempre o que é legal é legítimo e vice-versa.

Deve se ter em mente que o sistema-mundo político é regime por uma espécie de anarquia, pois, mesmo com blocos regionais (sobretudo de cunho econômico) e superpotências hegemônicas que atuam nas relações internacionais, não há, politicamente falando, uma direção única, um modelo que todos seguem à risca, não há um caminho que todos devem seguir. Assim sendo, no âmbito internacional, não há uma constituição geral que paute todas as pessoas de todos os países. Essa heterogeneidade pode ser considerada saudável pelo grau de independência que gera nas nações e no respeito às suas especificidades, mas também afeta na autonomia e fragmentação de organismos mundiais, tal como a ONU.

Por fim, outro fator a ser considerado é a ascensão do autoritarismo como modelo político clamado por alguns saudosistas de regimes conservadores, totalitaristas e/ou nacionalistas como ditaduras militares e fascismo. Em um cenário de estresse, cansaço e saturação popular, a alternativa extremista é atraente para, na teoria, colocar fim aos exageros de uma oligarquia sofista pervertida. A velha demagogia de palanque. A força e a coerção estatal são vistas como alternativas viáveis para o retorno da coesão social, o que no fundo se apresenta como uma ilusão tendo-se em vista as perdas dos direitos individuais, políticos e sociais. 

Hobbes já dizia, séculos atrás, sobre abrir mão de parte da liberdade individual para a construção de um Leviatã, um Estado forte e centralizador que traria paz e prosperidade para a sociedade. Quase 400 anos se passaram desde as discussões filosóficas sobre jusnaturalismo, propriedade privada e defesa do liberalismo e o que se vê na realidade é o oposto da perfeição teórica de tais autores.

A garantia da universalização dos direitos humanos é fundamental para que as pessoas sejam tratadas com dignidade e punidas conforme os seus atos, sem exacerbações. Afinal, gente deve ser tratada como gente. Não precisa concordar, basta respeitar o próximo. Quando a humanidade perder seu vínculo social e seu elo com a própria natureza será a verdadeira representação do fim.

sábado, 31 de agosto de 2019

Reflexão sobre o glossário geopolítico contemporâneo

Com o processo de intensificação da globalização, todos os dias há uma massificação de notícias e termos veiculados por todos os tipos de meios de comunicação. A luta pela versão vencedora da história e pelas narrativas cotidianas não são características exclusivas do século XXI, mas foram reforçadas pelos avanços tecnológicos. 

Desde a invenção de imprensa por Gutenberg até a atualidade, uma chuva de palavras é disseminada sendo que nem sempre a informação é transformada em conhecimento. Pensando nisso, separei alguns termos e seus significados tendo em mente os conceitos de forma ampla e genérica que ultrapassam fronteiras e se espalham por praticamente todos os territórios. Do global ao local com vistas ao cenário geopolítico contemporâneo e baseado nas definições dos Livros da Política, História e Sociologia da Editora Globo.


Alienação: condição dos trabalhadores que se sentem distantes de si mesmos ou da sociedade devido a uma falta de poder, controle ou satisfação. 

Anarquismo: abolição do governo autoritário (central) por meios violentos, se necessário, e a adoção de uma sociedade baseada na cooperação voluntária.

Anomia: um estado de confusão ou falta de normas resultante de rápida transformação social. Quando as normas e os valores sociais que governam a conduta diária mudam abruptamente, as pessoas podem se sentir desorientadas e sem propósito, até que a ordem social seja restabelecida.

Autocracia: uma comunidade ou Estado no qual a autoridade ilimitada é exercida por um único indivíduo.

Burocracia: sistema de organização caracterizado por uma hierarquia de autoridades ligadas a regras, que mantém registros detalhados de tudo o que fazem. Governo caracterizado pela especialização de funções e obediência a regras fixas.

Capital: ativos financeiros (como uma máquina) ou valor de ativos financeiros (dinheiro) usado para produzir renda. Um dos ingredientes-chave da atividade econômica, junto com a terra, o trabalho e os negócios.

Capitalismo: sistema econômico baseado na posse privada de propriedade e de meios de produção, no qual as firmas concorrem para vender bens com um lucro e os trabalhadores vendem seu trabalho por um salário.

Classe social: uma hierarquia e status dentro de um sistema social, refletindo poder, riqueza, educação e prestígio. Apesar de essas classes variarem por sociedade, os modelos ocidentais geralmente reconhecem três grupos: classe alta, média e baixa (também denominada de classe trabalhadora). 

Colonialismo: fenômeno em que um país exerce sobre outro, em geral explorando-o economicamente.

Comunismo: sistema econômico baseado na posse coletiva da propriedade e dos meios de produção.

Conflito de classes: tensão que pode surgir entre diferentes classes sociais como resultado de interesses socioeconômicos diversos.

Conservadorismo: posição política que se opõe a mudanças radicais na sociedade. Conservadores geralmente defendem uma ampla gama de políticas, incluindo preservação da liberdade econômica, empreendedorismo, livre mercado, privatização de empresas e redução da interferência do governo.

Consumismo: estado de uma sociedade capitalista no qual a compra e a venda de vários bens e serviços definem a época. O termo também se refere à percepção de que os indivíduos desejam bens para construir sua identidade, consumindo além do necessário.

Democracia: uma forma de governo na qual o poder supremo cabe ao povo e é exercido por seus representantes eleitos.

Determinismo: crença de que o comportamento de uma pessoa é determinado por alguma forma de força exterior, de modo que um livre-arbítrio genuíno é impossível.

Dialética: habilidade em questionar ou argumentar; ou ideia de que qualquer afirmação, seja em palavras ou em ação, provoca sua oposição, e as duas reconciliam-se em uma síntese que inclui elementos de ambas.

Distopia: sociedade teórica caracterizada por um Estado deplorável, disfuncional.

Direita: no espectro político, as ideias de quem acredita que desigualdades socioeconômicas devem ser reduzidas unicamente através do esforço dos indivíduos.

Ditador: governante absoluto que assume controle completo e pessoal sobre o Estado. Esse governante pode exercer seu poder de forma opressiva.

Elite: um pequeno grupo de pessoas que detêm uma quantidade desproporcional de riqueza e de poder em uma sociedade.

Emigração: ato de deixar o seu próprio país e se mudar permanentemente para outro.

Esquerda: no espectro político, as ideias de quem acredita que cabe também ao Estado reduzir as desigualdades socioeconômicas.

Estado: uma autoridade organizada que tem controle legítimo sobre um território e o monopólio do uso da força dentro dele.

Fascismo: ideologia tipificada por forte liderança, com ênfase na identidade coletiva e pelo uso da violência ou guerra para expandir os interesses do Estado. 

Feminismo: um movimento social que defende a igualdade social, política e econômica entre os sexos. 

Genocídio: matança deliberada de um grupo de pessoas pertencentes a uma mesma religião, etnia ou nação.

Gentrificação: mudança no caráter de uma comunidade urbana decadente que é observável através do aumento no preço das propriedades e no influxo de indivíduos mais ricos.

Globalização: a crescente interconexão e interdependência de sociedades ao redor do mundo, à medida que a mídia e a cultura, os bens de consumo e os interesses econômicos se espalham globalmente.

Glocalização: a modificação de formas globais - desde tendências de moda a gêneros musicais - através do contato com comunidades locais e indivíduos.

Golpe de estado: ato repentino, ilegal e violento de derrubada de um governo ou de um líder. Geralmente é cometido por membros do atual establishment político.

Hegemonia: a conquista da manutenção do poder e a formação de grupos sociais durante esse processo. Antonio Gramsci diz que a hegemonia é a forma como a classe social dominante mantém sua posição.

Identidade: a forma como os indivíduos definem a si mesmos e como as outras pessoas os definem.

Ideologia: um arcabouço de ideias que oferecem um ponto de vista ou conjunto de crenças para um grupo social.

Imperialismo: política de estender o domínio de uma nação por meio de intervenção direta ou indireta nos assuntos de outros países, e a conquista de território e a sujeição de povos na construção de um império.

Marginalização: processo pelo qual uma pessoa ou um grupo de pessoas são excluídos de um grupo poderoso ou dominante, com a consequente perda de poder, status e influência.

Nação: um corpo de pessoas unidas pela cultura, pela história ou pela língua, quase sempre compartilhando uma área geográfica.

Nacionalismo: um senso compartilhado de identificação que é atribuído a uma nação e brota do compromisso com uma ideologia ou cultura em comum.

Neoliberalismo: filosofia política e econômica arraigada na crença de que os livres mercados, o governo limitado e as respostas dos indivíduos oferecem melhores soluções para os problemas que a ação do Estado.

Normas: regras sociais que definem qual é o comportamento esperado de um indivíduo em uma sociedade ou situação em particular.

Oligarquia: forma de governo na qual o poder é mantido por um grupo pequeno e exercido em seu próprio interesse, quase sempre em detrimento da população como um todo.

Patriarcado: um sistema de estratificação social no qual os homens dominam, exploram e oprimem as mulheres.

Racismo: discriminação contra pessoas, geralmente identificadas pela cor da pele, com base em supostas diferenças biológicas, quando, de fato, essas diferenças biológicas foram provadas pela ciência como não existentes.

Soberania: poder supremo como o exercido por um Estado ou governo autônomo, livre de qualquer influência externa ou controle. Geralmente usada para se referir ao direito de uma nação à autodeterminação em assuntos internos e nas relações internacionais com outros países.

Social-democracia: movimento de reforma política defendendo uma transição gradual do capitalismo para o socialismo, por meios pacíficos e democráticos. Seus pressupostos típicos incluem o direito de todos os cidadãos a educação, saúde, salários dos trabalhadores e ausência de discriminação.

Socialismo: uma doutrina política que visa estabelecer igualdade social e econômica. 

Status: a quantidade de prestígio ou importância que uma pessoa tem aos olhos de outros membros da sociedade.

Superpotência: nação soberana com grande poder político e militar, capaz e influenciar a política internacional.

Totalitarismo: regime que subordina os direitos dos indivíduos em favor dos interesses do Estado através do controle de assuntos políticos e econômicos e da determinação de atitudes, valores e crenças da população.

Urbanização: processo de mudança das pessoas de áreas rurais para cidades, e as mudanças sociais que o acompanham. O mundo é crescentemente urbano.

Valores: ideias ou crenças a respeito do valor de uma coisa, processo ou comportamento. Os valores de uma pessoa governam a forma como ela se comporta; os valores de uma sociedade ditam o que é importante e o que não é, o aceitável e o inaceitável. 

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Reflexão sobre o mito da caverna

O pior cego é aquele que não quer ver. Envolto na neblina dos grandes meios de comunicação, verdadeiros oligopólios, negócios de família que transmitem uma visão de mundo de acordo com os próprios interesses. Não existe imparcialidade. Alienados no sofá diante da tela. Correntes voluntárias de indivíduos de massa, forjada pela ignorância planejada detalhadamente pelo não incentivo ao ensino e educação. 

Sem cidade, sem cidadania, ilusão demagoga sobre democracia para manter os privilégios de poucos. Nada mais do que governar para a própria família. Mais vale um gado do que um cidadão para manter os dogmas e paradigmas presentes nas sombras da caverna. Política do confronto e do medo, jogo de falácias, pão e circo. Discursos para aliviar a dor do gado na contínua fuga de debates. Mais uma novela da vida real entre o bem e o mal na busca por heróis e vilões em meio à imperfeição humana. As sombras da caverna permanecem.

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O mito da caverna foi uma alegoria escrita por Platão no livro A República para representar os riscos do senso comum diante da falta de pensamento e de diálogo. A parábola trata de um grupo de pessoas presas em uma caverna por correntes e forçados a enxergarem apenas a parede que ficava no fundo da caverna. Atrás dessas pessoas havia um muro, uma fogueira no alto e, entre ambos, uma passagem na qual outros indivíduos transitavam e cujas sombras dos objetos que carregavam eram projetadas na parede da caverna em que os prisioneiros eram obrigados a observar.

Em um determinado dia atípico, uma das pessoas consegue se desvencilhar das correntes e se liberta da caverna saindo para o mundo exterior. O choque do indivíduo é imenso ao reparar que a realidade ia muito além do que as simples imagens refletidas na parede da caverna. Assustado com a novidade repleta de formas, cores, luz e objetos, o ex-prisioneiro deseja retornar para a caverna. Entretanto, aos poucos, o mesmo assimila os fatos à sua volta e passa a admirar a paisagem e sua diversidade.

Tomado pelas novas informações e sensações, o fugitivo retorna para a caverna para compartilhar as novidades e dividir a experiência com os prisioneiros. Mas, para a nossa surpresa, as pessoas da caverna não acreditam em suas palavras. Para evitar que suas ideais atraísse mais pessoas e que "tamanha insanidade" se espalhasse dentro da caverna, os prisioneiros matam o fugitivo. "Só existe o que vê e o que vê é só o que há". Homo sem sapiens (homem sem sabedoria). 

Mito da Caverna.

Os pensadores da chamada Escola de Frankfurt alertam para o perigo da manipulação da mídia, imposição da ditadura por meio de uma suposta verdade absoluta e controle da informação. Afinal, para quem está no poder não é interessante uma ruptura. Quanto mais poder concentrado melhor e para atingir tal fim o meio mais fácil é a desinformação levando à apatia e ao enfrentamento com aqueles que pensam diferente. Desigualdade por meio de cortes e o monopólio do uso da força. Apenas um rebanho para dizer amém. Como exemplo é possível citar a ascensão do totalitarismo no início do século passado. Refém da própria estupidez. 

É preciso pensar, ter senso crítico para sair do comum. É preciso entender, ler além da notícia, transformar informação em conhecimento. É preciso encontrar a luz para se libertar das correntes da caverna. É preciso ter opinião própria para não se deixar levar pela onda de segundas intenções. Ser diferente, resistir, nadar contra a corrente baseado em fatos, sem a ilusão e pretensão de supostos seres míticos. "Permanecer de pé, de pé até o fim". Quando uma nação se torna refém de mitos e há banalização do bom senso é sinal de que a humanidade perdeu sua essência, tornando-se mais selvagem e irracional do que a mais bruta pedra. 

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Reflexão sobre o elevador

Tantos números, qual o botão?
Luzes que mudam
Uma outra estação
Um novo andar
Cansado das escadas
A porta se abre
Um velho reflexo no espelho
Fios brancos de cabelo
Pessoas estranhas entram e saem
Correm sem nunca chegar
Som de correntes batendo
Barulho para silenciar
O acidente é inevitável
Eu ainda me pergunto qual o motivo
Qual o meu lugar?
As luzes se apagam
Preso no elevador
Seria melhor ter ido pelas escadas
Sem conexão
Deve haver um outro jeito de se comunicar
Sozinho com a solidão
A vida é uma caixa de ilusão
Obrigado por estar comigo
Prometo não machucar o seu coração
Esperando a ajuda chegar
Nunca chega a minha vez
Cansado de tanto esperar
A velha sensação de prisão
A imagem do espelho sem reconhecimento
Qual é a minha identidade?
Sempre em constante deslocamento
Pessoas diferentes em cada andar
Tantos anos morando sem conhecer
Novos rostos em velhas faces
A faca afiada continua apontada
Cortando a pele a cada segundo que passa
Lembrar de mim
O cheiro das horas em claro
O frio na barriga a cada morte que passa
Prometa que não vai doer
Quando será a minha vez?
Preso nesse elevador todos os dias
Assistindo a mesma cena
Pessoas com pressa sem se importar
Para onde vão?
A idade que não permite andar
Uma criança sorridente a brincar
O chão é o mesmo, mas não o mesmo lugar
Uma foto familiar
A saudade não é em vão
Pegue o seu troco
Não aceitamos devolução
Ele vai levar a dor
As mesmas ruas
Os andares passam sem questionar
Uma nova pessoa
A vida tem que continuar
Batalho tanto sem alcançar
Mesmo subindo a sensação é de estar no primeiro andar
Ele vai elevar a dor
Ele vai
Elevador
Ainda dá tempo?
Um universo frente-a-frente
Mas um oceano separa a gente
Qual o tamanho do infinito?
Somos os mesmos com outros pensamentos
Somos diferentes
Ainda há tempo para recomeçar?
Um sorriso inesperado
Uma conversa no jantar
O mundo está tão agitado
Sufocado na própria gravata
Preciso de um pouco de ar
Preciso respirar além dessa liquidez que afoga
É preciso aprender tudo de novo
Permita ir
De barriga para cima
Então vai
Em busca do próximo lar
Preso em um quadrado perfeito
Difícil de imaginar
Apenas você e o espelho
Permita ir
Sem correntes para segurar
Então vai
Em busca do próximo andar.

quarta-feira, 10 de julho de 2019

Reflexão sobre o ponto cego

O que é o ponto cego? Em homenagem ao dia internacional do rock (13/7) este post será diferente: toda a estrutura textual será com trechos das letras presentes no álbum Ponto Cego da banda Dead Fish. Diante dos fatos como a manipulação do judiciário, a sede por verbas do legislativo e a eleição de um governo incompetente para o executivo, a banda expressou de forma brilhante toda a sua contestação furiosa sobre os processos que se dão no laranjal Brasilis. É uma obra de arte tão atual e coerente que chega a dar esperança em meio a tanta desilusão. O que é ponto cego mesmo? Obrigado!

Só existe o que vê e o que vê é só o que há. A todo o resto é permitido suprimir e eliminar, mas as sombras da caverna permanecerão lá. O medo e a ambição buscam um aliado para manter tudo igual. Enfrenta fantasmas com munição, quem julga nunca sangrar? Passa o muro, passa a grade, passa a porta, passe a chave. Certezas sem questionamentos, a voz que não se faz ouvir. Qual valor em ser o melhor em um? Destruir para dominar, agredir e avançar. Quem é mais irracional? Nada vai sobrar. Trancado de nove às seis, neurose alimentada, a violência vai vencer. É o preço que se paga.

Capa de "Ponto Cego" (Dead Fish)

Sim, sim, sim! Sim, foi golpe orquestrado por sorrisos velhos e apertos de mão rumo ao passado. A esperança das ruas de 2013 catalisou aquele grande acordo nacional com o Supremo e com tudo para estancar uma sangria em nome da família e de um torturador. Uma jovem democracia acorrentada nos porões para que velhos ratos possam voltar a reinar. Comprando a justiça não há corrupção entre brancos e ricos, pois ninguém é julgado e a vida segue. É o preço que se paga.

Elevadores são feitos para subir, as minorias não vão poder usar. Escadas e entrada de serviços, ponha-se em seu lugar. Motivo de vergonha, indignação. A cumplicidade das panelas. O lado certo da história não tem sangue nas mãos. Quando o passado volta à moda em nome de um torturador, o sonho médio é vestir a carapuça do opressor e achar que tem poder. Buscando um inimigo, fomenta a paranoia e faz para confundir. Crianças ficarão longe do senso crítico, quem fraquejar será imediatamente punido. Aponta a arma para si e é assim que começa. É o preço que se paga.

Pelas passarelas de concreto, um idiota, um cidadão de bem desfila com seus cachorros de marca, acessórios do status quo. Fetiche do autoritário, a rédea curta em suas mãos, subordinado adotado para aliviar a tensão. Aperta o passo, aperta o laço mostrando quem é de quem. Correção educativa não se aprende sem sofrer. Liberdade limitada, vigilância para o bem. Pobres cachorros. Os muros serão altos, conter e vigiar. Traços subversivos, punir e delatar. É o preço que se paga.

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A distopia que era mito, fundamentada por debates mudos e evasivas, foi endossada, foi eleita. A voz daqueles que só pensam em si para defender o status quo que foi imposto e governar pelo dinheiro. Presos em seu umbigo-mundo, tudo ao redor é ponto cego, puro vitimismo. Cortar direitos, sem empatia, privatizar a qualquer preço é progredir. E não termina assim, é só o começo. Quem paga o preço por um cento enriquecer e prosperar? Visto de cima não parece tão ruim. Distribuída ordem na vertical. O conservadorismo hipócrita do pregador elege seus bolsos. A justiça tira a venda e escolhe o vilão. É o preço que se paga.

Na guerra não convencional, na doutrina do choque, o predador neoliberal faz a festa interferindo no processo eleitoral. Comprando a justiça não há corrupção. Do deus mercado e capital desregularizado se alimentam oligarcas. Reserva de petróleo que não lhes cabe parte necessita intervenção. Novo sistema laboral, fábrica de escravos prioriza oligarcas devorando tudo até não sobrar nada, capitalismo do desastre. Destruir para lucrar com a reconstrução, trocar de dono. No ponto cego está toda a população, meros inquilinos empreendendo, pagando a conta para o bem-estar de poucos. É o preço que se paga.

Desigualdade aumenta, a repressão também, uma guerra de classes beneficia a quem? Fez-se o tumulto e a desinformação, daí surgiu a oportunidade. Instala-se o medo e a insensatez que não aflige quem tem muro e grade. No ponto cego é fácil disfarçar o cheiro podre de todo andar. Congele o investimento em saúde e educação, reduza a idade de trancá-los na prisão. Busque um emprego com a terceirização, pode negociar direto com o patrão. Aceite a migalha e nem pense em reclamar, pois sempre terá outro querendo o seu lugar. É o preço que se paga.


Preste atenção ao demagogo há trinta anos nesse jogo. Sem diálogo, nem projetos, dando graças ao ódio e ao medo. Se a democracia estiver entre o rei e o que ele quer é a caneta ou a espada que prevalecerá. Em meio à crise, autoritário opressor vem para contagiar. Sacramentada pós-verdade, rebanho pronto para aceitar, criados para matar. Não vai adiantar tentar esconder. No ponto cego neutro e seguro que encontrou dentro de um vazio que não cicatrizou. Água empoçada, rigidez, torpor, discurso de casta, modelo importado. Baixa tolerância, alta infração, seguindo a hierarquia e vivendo em negação. É o preço que se paga.

A epidemia se espalhou por todos os lados. A mentira viralizou, tornou-se real. A narrativa vinda do colonizador tingiu de branco nossa história e sem escrúpulo omitiu e apagou o outro lado da moeda. O passado frágil corre para se proteger, tranca a porta e fecha as cortinas. Do ponto cego da história brotam vozes de resistência e de luta. O velho se põe a gritar, espernear, tentar abafar a inevitável mudança. Mas cada dia mais janelas vão se abrir e a diversidade vai brilhar ao sol.